• 8 de junho de 2016

    Prazer e liberdade

    – Mas Akim, é muito chato isso.

    – Ok, mas o que não é chato para você?

    – Como assim?

    – Você reclama muito, o que me faz ver que você é uma pessoa crítica, concorda?

    – Sim, sou muito. Não gosto de ver as coisas do jeito que são.

    – Exato, por outro lado, também não cria nada seu.

    – Ai… doeu…

    – Sim, doeu e incomodou não é?

    – É!

    – Se você se permitisse guiar por este incomodo que sentiu agora, o que faria com sua vida?

    – Ah sei lá… peraí… eu acho que eu ia bolar um projeto e abrir tipo aquelas startup sabe?

    – Porque não faz isso?

    – (silêncio)

     

    Liberdade e prazer são dois temas extremamente populares em nossa cultura. Verdadeiras metas de vida, tornam-se uma ideologia e terminam por serem avaliadores da vida das pessoas, porém, até que ponto esses dois elementos são realmente compreendidos para serem usados dessa forma?

    Para a cultura Ocidental padrão a liberdade é confundida com onipotência. Embora eu já tenha falado sobre o tema em outro post, vale a pena lembrar que o mote da liberdade é “fazer o que eu quero, quando eu quero e do jeito que eu quero”, ora, isso não é liberdade, isso é onipotência. Podemos ficar apenas com o primeiro: “fazer o que eu quero” é onipotência, principalmente quando isso significa fazer tudo que eu quero.

    O prazer é tido em nossa sociedade como a expressão máxima daquilo que se pode obter da vida. A sensação de prazer é vendida como algo que necessita estar presente para sabermos que a vida vale à pena. Em resumo, confundimos prazer com sentido de vida. O prazer enquanto sentido de vida é um problema pelo fato de que esta sensação sofre de uma consequência chamada “habituação”. A habituação, como o nome diz, nos faz parar de sentir um determinado estímulo como prazeroso por estarmos habituados à ele. É como comer todo dia a mesma comida: paramos de sentir o prazer que ela nos causa.

    Assim, quando o prazer e a liberdade como metas de vida são encarados da maneira vista acima, criam-se expectativas que, simplesmente, não poderão ser alcançadas e irão gerar muita frustração. Sentir prazer o tempo todo, com tudo o que fazemos é uma meta irrealista e pobre, existem muitas emoções e sentimentos que podemos sentir ao nos jogarmos em uma tarefa que podem ser muito melhores que o prazer. Outro ponto é que o prazer é sensorial, porém, não necessariamente edificante. Em outras palavras é bom de sentir prazer, mas isso pode não acrescentar nada – e deixar você viciado na sensação.

    A liberdade enquanto onipotência vai na mesma vertente, se você acha que “tudo pode”, irá se frustrar muito porque a vida lhe fornecerá muitos exemplos de onde e como você “não pode”. Porém a pessoa que tem a expectativa irrealista de “tudo poder” sentir-se-a fracassada e pode, até mesmo, deprimir frente à percepção de como a realidade funciona.

    Assim, dois aprendizados se tornam fundamentais: aprender a lidar com a frustração (aceite: você não vai “poder fazer tudo o que quer”) e conhecer outras formas de satisfação além do prazer. Estes dois aprendizados fazem referência a maneiras mais realistas de encarar aquilo que buscamos quando falamos em liberdade e prazer.

    A “liberdade” pode ser conceituada como a capacidade de fazer e lidar com escolhas. Assim, não é necessário fazer tudo o que quer para sentir-se livre, mas sim, sentir-se capaz de realizar escolhas com consciência. Epiteto, filósofo romano, nascera escravo e versa sobre a liberdade enquanto uma faculdade mental antes de ser um direito ou status social. Podemos pensar em Nelson Mandela que, mesmo tendo sido preso durante 25 anos, disse que, durante este tempo, estava se preparando para ser presidente.

    Já a questão do prazer deve ser redefinida enquanto a capacidade de satisfação que é a sensação responsável pelo prazer. A excitação sensorial ocorre com oscilações de falta e excesso de estímulo. Se temos excesso de um determinado estímulo ficamos sobrecarregados, se temos falta, subdesenvolvidos. Porém o ponto é que é possível satisfazer-se em vários níveis por assim dizer, além do sensorial. Pessoas que realizam tarefas, muitas vezes tem desgaste ao invés de prazer e, mesmo assim, sentem satisfação ao final do processo. A questão é: o que lhe falta? Entrar em contato com a falta é que nos proporciona a sensação de satisfação quando conseguimos suprir a falta.

    Assim, deixo dois desafios: (1) como se tornar livre dentro da rotina que você já possui? (2) o que falta em sua vida para alimentar sua alma? Responder estas duas perguntas significa entrar em contato com angústia criativa, uma forma específica desta sensação que é uma definição pessoal de liberdade que não envolve a crença em fazer tudo o que quero, mas sim, viver aquilo que há e não busca ir além do prazer enquanto sensação única de satisfação.

    Abraço

     

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