• 1 de outubro de 2012

    O que dizer?

    – Então Akim, não sei porque eu vim hoje… não tenho muito para falar.

    – Ah é é?

    – É.

    – Opa, coisa boa… não planejou muito o dia de hoje é?

    – Não… não planejei (risos)

    – Perfeito… então vamos ver o que vai acontecer, afinal de contas, você veio não é?

    – É vim né?… Sabe… acho que eu quero te falar só que já entendi o que eu preciso fazer sabe? Não que eu esteja 100% já, mas… não tenho mais dúvidas do que fazer…

    – Sim, entendo… não tem mais que ficar argumentando contra a mudança não é?

    – É… algo assim… sei que é aquilo… não sei ainda como fazer, nem direito se tenho coragem… mas… é isso. Eu penso e repenso e caio no mesmo problema, na mesma solução… não tem mais o que ficar apenas pensando… tenho que agir um pouco também sabe?

    – Perfeito!

    – E não é só na vida com as pessoas, é comigo também entende?

    – Claro!

     

    Muitas vezes as pessoas “não sabem o que dizer” junto ao terapeuta. Muitos, inclusive cancelam as sessões como se tivessem que ter um script do que falar, como se tivessem que ter produzido algo. Pois bem, muitas vezes “não ter o que falar” significa terapeuticamente falando “mais” do que ter.

    As pessoas não se dão conta de que, muitas vezes, o que estão falando em terapia não é sobre suas “mudanças”, “crescimento”, “evolução”, mas sim argumentos que as levam sempre para justificar ficarem no mesmo lugar. Uma famosa terapeuta uma vez falou sobre o “paradoxo da terapia”: “quero mudar a minha vida, desde que eu não precise mudar”. E muitos dos nossos argumentos são apenas isso, justificativas sobre o porque eu deveria não mudar para que tudo mude ao meu redor.

    “Não ter o que falar” – dentre outras interpretações – muitas vezes significa que a pessoa cansou desta argumentação ou que se deu conta da sua inutilidade, de que, para mudar ela precisa mudar – pode parecer óbvio, mas este óbvio muitas vezes não é tão claro. É quando não tenho mais o que ficar falando, argumentando, contra-argumentando que eu posso, simplesmente ver com clareza os meus atos, minhas defesas, meus medos. Existe um “silêncio rico” em que a confusão mental cessa e tudo fica mais claro – muitas pessoas confundem isso com mente “não-produtiva” ou “não pensei em nada” – e nesse momento é fundamental a terapia porque é aqui que ela realmente acontece.

    Porque?

    Porque este é o momento de virada. É como se você vivesse com o pé machucado, cortado. E vai no médico sempre reclamando disso. O médico dá um remédio, cura os cortes, conversa contigo. Depois de um certo tempo você começa a perceber que o problema não são os cortes no seu pé, mas sim que você não usa calçados! E então chega até o seu médico e diz isso para ele. Aqui é que a mudança começa a ocorrer – parar de reclamar, ver o que se faz, aceitar isso e entender que é necessário uma mudança de atitude, aceitar essa necessidade e realizá-la. Por este fato é que geralmente os psicólogos dizem – com razão – de que as sessões em que não se tem nada para dizer são as mais produtivas.

    Abraço

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