– Não consigo me expressar.
– Expressar o que, especificamente?
– Eu sabe? “Eu”!
– Claro que sei, mas o que seria expressar “eu”, no caso “você”?
– Eu não sei!!
– Então vamos pensar, o que poderia ser uma expressão de “eu” no seu caso?
– (Silêncio) Aquela música do Lenny Kravitz “Fly Away”.
– Hum, perfeito! O que tem nela de “eu”?
– Que eu quero conhecer o mundo, sinto essa vontade de ir além!
– Ótimo, como você expressa esse desejo no seu dia a dia?
– Eu acho que só reclamando da cidade (risos).
– Sim, só que essa não é uma forma legal de fazer isso não é mesmo?
– É, bem… não me acrescenta nada além de raiva daqui né?
– Pois é! De que outra forma você poderia expressar essa parte sua?
– Acho que eu poderia planejar as viagens que eu quero fazer, os lugares que quero ir e me preparar né?
– Acho muito mais interessante! O que mais significa “eu”?
– Eu acho que estou entendendo que eu quero me expressar, mas não sei o que extamente… acho que “eu” neste momento tem a ver com “dúvida” também sabe?
– Sim, é isso mesmo, muitas dúvidas não é mesmo?
– É… é engraçado… eu não gosto de sentir que tenho dúvidas… mesmo isso sendo parte de mim hoje.
– Às vezes é difícil aceitarmos algumas coisas em nós mesmos…
– Pois é
– E isso prejudica a nossa auto expressão.
– Entendi.
Expressar. Muitas pessoas reclamam disso no consultório, porém quando perguntamos coisas básicas como: o que você quer expressar? Como quer fazê-lo? Para que? Elas não possuem respostas.
Muitas vezes o que existe não é nem a necessidade de expressão, mas apenas a inquietação, a angústia de “algo que esta ali dentro” e não se sabe o que e nem como é. É importante aprender a entrar em contato com isso de uma maneira a não apressar o processo de entendimento, negá-lo ou negligenciá-lo. Aprender a ter este domínio é algo importante para o amadurecimento e para a auto-expressão.
Existe uma diferença entre expressar e “vomitar” o que temos dentro de nós. A expressão envolve a participação ativa da pessoa no processo de descoberta do que expressar e da forma a ser usada para isso, é um processo criativo e “responsável” que envolve a vontade, o desejo e a escolha da pessoa. A expressão dá uma sensação de alívio e de realização, muitas vezes seguida de orgulho pessoal. Vomitar não, é apenas a descarga de algo que está lá dentro, em geral o “vomito” ocasiona um profundo alívio seguido de sensação de culpa e de “não era bem isso que eu queria dizer”. É o famoso ditado: fala o que quer, ouve o que não quer. Muitas pessoas confundem expressar e vomitar.
Para que você se ajude neste processo permita que a inquietação dentro de você exista. Keleman usa o termo “conter”, conter é prestar atenção ao que ocorre, entrar em contato com a sensação, pensamento sem precisar realizar nada com aquilo. A contenção é um passo importante para compreender o que querermos e como querermos. Conter é totalmente diferente de reprimir, pois a intenção da contenção é criar contato e buscar expressão que é diferente da repressão que busca afastar o conteúdo da consciência.
Se você conseguir conter, entrará em contato com aquilo que existe dentro de você. Assim sendo a próxima pergunta é: o que é isso? Uma sensação? Um desejo? Um pensamento? Algo que quero evitar?Algo que quero me aproximar? Outras vezes fazer perguntas não ajuda muito, em algumas situações o mais interessante é entrar em contato com a sensação e simplesmente permitir que a mente vagueie criando imagens até que uma ou alguma delas façam mais sentido que outras. Em outras situações a pessoa pode preferir conversar com alguém ou ouvir músicas até que uma delas fale algo ou tenha um ritmo que seja ligado àquilo que ela quer perceber e expressar.
Após o “o que” estar definido vem o “como”, “para que” e “onde, quando”. Criar todo este cenário é que chamamos de expressar. Obviamente isto não precisa ser feito de uma maneira racional, pode ser algo muito afetivo e “lento”, por exemplo, o importante é que o que for “sair” da pessoa realmente lhe diga algo, adquira sentido e significado, trazendo alívio, orgulho, realização.
Abraço
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