- Eu quero fazer, mas não sei se devo.
-
O que te impede?
-
Meu pai… sei que ele ficará chateado com isso.
-
Sim, muito provável. Mas e o seu desenvolvimento?
-
Ele também ficaria chateado com isso (risos)
-
(Risos) Sim, ficaria mesmo…
-
Então?
-
Então… você está querendo chatear o seu pai? É esta a sua intenção?
-
Não… você sabe que não!
-
Eu sei… tanto sei que não entendo porque você está tornando isso um empecilho pra ti.
-
Hum… verdade… simplesmente vou ter que enfrentar a chateação dele né?
-
Sim… sabe como fazer isso?
-
Acho que é nisso que eu preciso de ajuda
-
Vamos lá!
Os gregos diziam “cuidado com o que quer… porque pode conseguir”. Obviamente nada mais estranho aos ouvidos modernos ávidos pela conquista de seus desejos. Porém, em consultório eu vejo o quanto esta frase faz sentido. Ela tem tanta sabedoria que, na maior parte das vezes, as pessoas sequer correm atrás de alguns sonhos e desejos por causa dela.
Um dos pontos que eu vejo muito é que as pessoas nem sempre estão em paz com aquilo que desejam. O desejo pode estar em conflito com os valores da pessoa, com alguma crença específica ou pode estar vindo “no momento errado”. Assim, mesmo cientes de um determinado desejo elas procuram se afastar dele, culpabilizar o mundo por não conseguirem aquilo que querem ou tornam-se apáticas frente aos próprios desejos e sentimentos.
Quando o desejo cria um conflito é muito comum da pessoa sentir a emoção da culpa. A culpa nos mostra que estamos fazendo – ou querendo fazer – algo que vai contra o nosso sistema de crenças. Muitas vezes uma das maneiras de lidar com a culpa é verificar se, efetivamente, estamos ferindo algum de nossos valores. Isso é importante porque muitas vezes o aprendizado que temos nos leva a crer que determinado comportamento ou querer são, por si só, ruins e nem sempre isso é assim.
Um exemplo muito comum na nossa sociedade é o de fazer algo que sabemos que pode ferir, incomodar ou chatear alguém. Em geral, nossa educação nos pede para nunca ter este tipo de atitude para com alguma pessoa, no entanto, na prática logo percebemos que isso é impossível. Não estou defendendo o ato de causar dano à alguém de maneira indiscriminada, mas sim de que algumas vezes chatear outra pessoa poderá ser um dos resultados de um comportamento importante para a pessoa.
Na educação das crianças, por exemplo, chega um momento em que é saudável a mãe não atender de pronto os choros da criança. Tal atitude obviamente faz a criança sofrer, porém é necessária ao desenvolvimento da mesma e sabemos que as crianças que passam por isso em geral crescem melhor por terem que aprender a lidar com a frustração que é comum na vida.
Outro fato é que existe uma diferença entre o desejo de causar chateação e esta ser uma consequência do meu comportamento. A primeira tem a intenção de chatear alguém, é algo programado e pessoal como na frase “eu quero me vingar dele”. Há uma intenção clara de comportamento nesta frase. Já quando a chateação é uma consequência a intenção não é de ferir, seria algo como “sei que ele ficará chateado, mas preciso educá-lo”. A chateação não é a intenção, mas sim educar.
Coloco estes pontos para questionar um dogma central da educação que praticamente todos temos: que pode ser “bom” chatear os outros. Isso não é uma desculpa para ferir os sentimentos dos outros de maneira indiscriminada e cruel, mas sim para compreender que, algumas vezes, esta consequência não pode ser evitada e em outras que ele pode ser benéfica à pessoa. Particularmente tive grandes aprendizados em minha vida após ter sido frustrado e ter ficado chateado com a atitude de algumas pessoas. E não digo isso num sentido de me fechar ao mundo, mas pelo contrário de me abrir à ele de uma nova forma.
Aprender que nem sempre é ruim chatear os outros e que existe uma diferença entre chatear alguém intencionalmente e isso ser o resultado de uma ação sem esta intenção são alguns dos valores e crenças que trabalho no consultório para ajudar as pessoas a fazerem mais aquilo que desejam. Isto ajuda a pessoa a dizer “sim” ao que quer sem sentir culpa e saber que ela sentir, por exemplo tristeza – sim podemos ficar tristes de ver que alguém ficou ferido em detrimento de algo que fizemos, mas isso é diferente de sentir culpa por isso.
Dizer-se “sim, sem culpa” é nos colocarmos como critério para definir o que vamos fazer e verificar se estamos fazendo aquilo que queremos como meio para ferir alguém – o que eu não aconselho fazer em consultório – ou como meio de seguir o nosso caminho pessoal de desenvolvimento e auto expressão – o que apoio por mais difícil que seja a situação.
Abraço
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