• 16 de setembro de 2015

    Timidez

     

    – Mas é que… aí, não sei o que dizer

    – Não sabe? Bem, o que as pessoas dizem quando puxam assunto com alguém?

    – Ai… “oi”, “que roupa legal”, ou tipo, puxam um assunto que a outra pessoa está falando.

    – Sim, você não sabe dizer isso?

    – Pensando assim eu sei.

    – Mas?

    – Mas… e se a pessoa não gostar ou me achar intrometida?

    – O que pode acontecer?

    – Ela vai me dar um corte!

    – E?

    – É ruim ganhar um corte.

    – É. E?

    – Como assim “e”?

    – É ruim ganhar um corte, ponto. E… qual o problema? Você vai morrer se receber um? Ninguém pode dar um corte em você? Você acha que é imune à cortes?

    – Não sei… ai sei lá… não vou morrer… mas… é…

    – Você não sabe o que fazer com isso, mas “isso”, ou seja, um corte, uma rejeição, é “só isso” e você não será o primeiro e nem o último ser humano a vivenciar isso.

    (fica me olhando com cara de surpresa)

     

    Muitas pessoas não são exatamente “tímidas”, mas sim pessoas com um simples medo de rejeição. Porque as pessoas temem algo que é tão comum na vida?

    No caso da rejeição o que achamos no consultório são duas vertentes básicas. Na primeira delas temos uma auto imagem idealizada e superprotegida. O que isso significa? É a pessoa que quando pensa em si, se imagina de uma maneira muito boa, otimista e forte. Porém esta auto percepção é enganosa porque foi criada dentro de um ambiente extremamente específico, ou seja, na casa dos papais.

    Neste ambiente a pessoa realmente podia tudo, fazia tudo, o que fala é ouvido e o que deseja atendido. Isso cria uma falsa noção de poder pessoal. A pessoa, no fundo, sabe que o “mundo lá fora” não é assim e como não sabe como lidar com o que não é super proteção ela sente medo. Assim aquela pessoa forte e admirável não passa de uma vitrine sem conteúdo conforme gosto de dizer. Ela sabe ser “super” quando está dentro da casa dos papais, mas fora dela é um “mini”.

    A segunda vertente é uma pessoa altamente cobrada com auto imagem, muitas vezes, inferiorizada. Enquanto no caso acima tínhamos alguém que se achava super em casa e mini fora, aqui temos uma pessoa que “sabe que é mini” o tempo todo. Assim, quando está em casa mede as palavras para não levar bronca e quando sai tem certeza que é melhor ficar calado para não receber bronca.

    Ambos possuem uma auto imagem deturpada que acaba colidindo no mesmo problema: não conseguir lidar com a rejeição. O primeiro não quer sentir porque não sabe o que fazer com ela, o segundo está cansado dela e prefere não correr o risco – que na cabeça dele não é um risco, é uma certeza. De qualquer forma o medo da rejeição é igual à ambos e está organizado em torno desta auto imagem deficiente.

    Aprender a ter uma auto imagem mais realista e conseguir construir interesse em torno de sua própria auto imagem é o início de um caminho que levará a pessoa a sentir-se interessante e bem quista – por ela mesma, essa “coisa” que chamamos de “auto estima”. Porém, isso não fecha o problema do medo da rejeição.

    No primeiro caso temos que trabalhar com a qualidade de sustentar-se sobre as próprias pernas. O super protegido precisa de pessoas o tempo todo para sentir-se bem. Ele só sabe sentir-se bem assim. Necessita de alguém aceitando tudo o que quer. Rejeição para ele significa a ausência disso, ser rejeitado, de fato é “o fim”. Assim essa pessoa precisa aprender que ser rejeitado é apenas isso, uma opção de uma outra pessoa. Nunca agradamos todo mundo, desejar isso é um desejo deslocado, irreal e o super protegido não sabe disso. Ele precisa dessa realidade para desvincular-se de uma auto imagem que tudo pode e tudo recebe para algo mais realista.

    Já o super cobrado – vamos chamar assim – precisa compreender que sua família de origem é muito cobradora, mas que o resto do mundo oferece outras oportunidades. Suas qualidades podem ser admiradas por pessoas fora do círculo familiar e ele pode sentir-se feliz e acolhido. É importante, também, saber lidar com a auto imagem e torná-la mais real no sentido de dar o devido valor ás suas qualidades, algo que a família que é super exigente não sabe fazer.

    Para este a rejeição é a confirmação de que ele, de fato, não vale nada. Ao contrário do super protegido que entra em choque com a rejeição (“como assim você me rejeita?”) o super cobrado se diz: “é… eu já imaginava isso, sou mesmo um otário”. Questionar este posicionamento e ajudá-lo a compreender que a rejeição não define o seu “eu”, mas sim, apenas a escolha do outro e que existem outras pessoas que vão gostar de “quem ele é” é fundamental para este caso.

    E com isso ambos podem aprender a ter novas relações, a lidar com o medo da rejeição que é, nestes casos, o verdadeiro sentido por detrás da palavra “timidez”.

    Abraço

     

     

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