– Eu tenho medo de me relacionar de novo. É isso.
– Muito bom, fico feliz que tenha percebido isso. O que motiva o seu medo?
– Eu já me entreguei antes sabe? Não deu certo.
– Não? O que deu errado?
– Eu acabei me ferrando, a pessoa entendeu aquilo como se eu estivesse na mão dela.
– E estava?
– Sim… de certa forma sim.
– Então o problema foi se entregar para a relação ou abandonar-se?
– Hum… acho que esse segundo né?
– Eu também acho.
Muitas pessoas temem entrar em relações porque confundem o ato de se entregar numa relação com o ato de se abandonar na relação e permitir ao outro “dominar” a sua vida. Perder a integridade e entregar-se são coisas diferentes, você sabe qual a diferença?
A integridade é a qualidade de quem é íntegro. Íntegro é a pessoa cujas ações, pensamentos e sentimentos seguem uma coesão. Quando há integridade, a pessoa se torna responsável por buscar o bem-estar e a saúde em todas as áreas de sua vida. Esta busca é ativa e leva em conta aquilo que é importante para a auto expressão da pessoa.
Nesse sentido, uma relação, por exemplo, faz parte das necessidades e desejos da pessoa. Respeita as suas necessidades e desejos, levando em conta aquilo que é importante para ela e para a relação. A pessoa que é íntegra cuida ativamente disso. Isso significa que ela não relega ao parceiro a responsabilidade pelo seu bem-estar e nem pelo bem-estar da relação, ela faz isso.
Então quando a pessoa busca por sua integridade, ela faz escolhas e estas tem uma relação profunda com aquilo que lhe é importante e traz bem-estar. Esse é o tipo de comportamento e atitude que permite que a pessoa se entregue. Afinal, ela não irá escolher uma relação qualquer, provavelmente não é daquelas pessoas que se joga em cima do primeiro que aparece. Não se trata de ficar buscando a perfeição e sim aquilo que é importante para o seu bem-estar.
A entrega é para a relação e não para o outro. Qual a diferença? Entregar-se ao outro dá para este o poder, entregar-se para a relação coloca na relação o foco e não no outro. Assim é que se torna possível, ao mesmo tempo estar entregue e cuidar de si. Se meu foco é na relação e na qualidade dela, estou profundamente entregue porque sinto no dia a dia que esta relação me mantém íntegro, nos meus desejos e bem-estar.
A confusão é gerada aqui. Quando a pessoa se entrega para a relação ela tem capacidade de avaliar e agir, ela está ativa junto com o outro, porém, quando ela se entrega para o outro, dá à ele o poder e a responsabilidade sobre o seu bem-estar e isso é um erro. O erro não é nem pelo fato de o outro ser capaz ou não de cuidar, mas sim pelo fato de que a responsabilidade pelo seu bem-estar é sua. Não se trata de não poder contar com o outro ou de não poder pedir ajuda, mas sim de que a responsabilidade é da pessoa, mesmo quando ela pede ajuda ou precisa contar com o outro.
Ao “entregar” a responsabilidade pela sua integridade ao outro a pessoa está sendo negligente com ela – e sobrecarregando o outro – e se abandonando. Assim, o grande problema surge não quando me entrego, mas sim quando me abandono, quando me perco de mim. Ao abandonar-se a pessoa deposita no companheiro a responsabilidade pela sua saúde, mesmo que o companheiro tenha a melhor das intenções ele irá falhar nesta tarefa, porque? Porque ele não tem acesso aos estados internos da outra pessoa, ele não sabe como é ser quem o outro é e, nesse sentido, ele é incapaz de saber 100% e o tempo todo o que é importante para o seu parceiro. Para aqueles que não possuem a melhor das intenções o que ele tem na sua frente é uma pessoa carente que fará tudo o que ele quiser.
Entrega diferencia-se de abandonar-se pelo fato de que na primeira eu me entrego à relação e mantenho a responsabilidade pelos meus estados internos e felicidade, na segunda me entrego à pessoa e projeto nela a responsabilidade por me fazer feliz. É importante, então, manter em mente sempre a integridade como uma responsabilidade pessoal e aprender a desenvolver ações que mantenham você íntegro.
Você se entrega ou se abandona?
Abraço
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