• 18 de abril de 2016

    Culpa e Responsabilidade

    – Eu não quero saber disso.

    – Porque não?

    – Não quero ficar me sentindo culpado entende?

    – Sim, mas de que maneira sentiria-se assim?

    – Ah, eu não fiz e daí ficam me culpando.

    – Bem, se você precisava fazer e não fez, o que está “plantando”?

    – Tá… eu sei que eu precisava fazer. Sei que agora vou ter que ficar um tempão correndo atrás e tal…

    – Mas?

    – Mas não quero sentir culpa!

    – Porque não? Você já está se culpando… não precisa de ninguém para te dizer isso.

    – É… na verdade é que eu sei que não está certo o que eu estou fazendo.

    – Hora de sentir culpa, então, e decidir fazer diferente. Porque é tão difícil se tornar responsável pela sua vida?

     

    É comum, na nossa linguagem, utilizarmos a palavra responsabilidade como sinônimo de culpa, no entanto, essas palavras se referem à experiências emocionais distintas e é importante compreender esta diferença. Você sabe como distinguir?

    Responsabilidade é a habilidade de ser responsável, ou seja, de ter resposta para uma determinada tarefa ou de ter dado resposta à uma tarefa ou situação. Responsável é quem a “capacidade de” desempenhar algo e atingir um resultado específico.

    Pais, por exemplo, tornam-se automaticamente responsáveis por seus filhos. No entanto, em alguns casos tristes, quando estas pessoas não conseguem desempenhar adequadamente a sua função elas podem perder a guarda sobre suas crianças. Neste cenário, os pais não são culpados, eles apenas não são suficientemente responsáveis – ou seja, capazes – de tomar conta de uma criança. Não necessariamente eles são presos, apenas perdem o direito à guarda.

    A responsabilidade, então, tem a ver com a maneira pela qual percebemos os desafios de nossa vida, os desejos que temos e como reagimos à eles buscando através da competência que temos ou que precisamos adquirir,  atingir as metas e vencer os desafios. Não há nada “errado” na pessoa não conseguir isso, ela, apenas, não conseguiu, irá sofrer uma perda eu não ter um determinado ganho, mas não se pode dizer, especificamente que ela está “errada” em um sentido moral, pois a responsabilidade tem a ver com a competência.

    Já a culpa é diferente, a culpa tem a ver com um sistema de crenças e moral que avalia os atos e os classifica em certos e errados, não de acordo com o resultado, mas sim com a moral vigente. Assim, por exemplo, temos que roubar é errado. Quando a pessoa rouba, não importa se foi para apaziguar a fome ou para comprar um iate, ela errou, portanto é culpada do ato. A confusão entre culpa e responsabilidade se dá porque, para ser culpada, a pessoa também deve ser capaz de executar o ato. Se ela é culpada por ter roubado é porque tem a capacidade de roubar.

    Porém emocionalmente é muito diferente a sensação de culpa e de capacidade. Sentir-se “capaz de” e “culpado de” são sensações distintas. Quando a pessoa se diz culpada, entende que está fazendo algo errado ou que ela é errada – muito comum em pessoas com baixa auto estima. Esta percepção faz com que ela busque punição ou auto comiseração e não uma mudança de comportamento, por exemplo.

    Em muitos atendimentos preciso trabalhar com a pessoa esta “limpeza moral”, ou seja, ajudá-la a perceber que está tendo resultados negativos em sua vida não porque é errada ou está fazendo “errado”, mas sim porque suas atitudes levam ao resultado não desejado. Retirar a culpa neste momento é fundamental para direcionar a atenção ao que realmente importa: a relação entre comportamento e resultado, a compreensão da responsabilidade.

    A culpa, no entanto, também ocorre no campo emocional. É quando a pessoa faz algo (responsabilidade) que viola o seu sistema de crenças de certo-errado (culpa). Nesta situação é benéfico sentir culpa, porém, a culpa tem uma função específica dentro do campo emocional e psicológico: servir como um intenso e poderoso sinal de mudança de atitude. Em outras palavras, a culpa que dura até 30 minutos é benéfica no sentido de ajudar a pessoa a repensar o que fez e tomar a decisão de nunca mais fazer, não é necessário mais que isso para tomar essa decisão. A culpa que se arrasta por dias é destrutiva.

    Muitas vezes a culpa pode se transformar em outras emoções que devem ser experienciadas em sua plenitude para que possam limpar o sistema psíquico. Nesta situação é saudável quando uma culpa é processada e, depois, a pessoa fica uns dias triste, por exemplo, pela perda que teve com sua atitude. Ao final de alguns dias ela se recupera e segue sua vida, num belo processo de aprendizado, mais sábia e consciente. Este tipo de ocorrência é saudável, diferente de uma pessoa que carrega anos uma dor e uma tristeza que nunca tem fim, por uma culpa mal empregada ou mal resolvida.

    Abraço

     

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