Sim, você vai sofrer.
Nenhuma filosofia ou religião nega o sofrimento humano. Portanto, pode esperar: você vai sofrer nessa vida. Minha ideia não é tentar dar um sentido especial para a dor para fazer com que ela não doa. Pelo contrário é dizer que ela dói, é chata, incomoda e não tem como viver sem ela. Então, ao invés de ficar gastando seu tempo buscando uma forma de não sofrer, entenda quais sofrimentos você consegue dar conta e se torne mais forte para suportar aqueles que você não dá conta hoje.
Muitas pessoas buscam fugir da dor e do sofrimento. Esta busca apenas as leva para mais longe da vida. Hoje em dia temos uma crença estúpida que nos diz que é possível uma vida sem sofrimento ou dor. Porque digo “estúpida”? Porque o corpo humano é instrumentado para sentir dor. A dor pode não ser prazerosa, mas é necessária.
Dor não é o oposto de prazer, este é o segundo motivo pelo qual a propaganda “vida sem dor” é estúpida. Neurologicamente falando a dor e o prazer tratam de fenômenos muito distintos e nem de longe complementares. A dor tem a ver com lesões, prazer com falta. Sim, prazer está ligado à falta. É só quando sentimos falta de alguma coisa que o prazer poderá ser sentido. Quando a falta não existe, a necessidade de buscar não se forma é o preenchimento da necessidade que gera o prazer.
Lidar com a dor e o sofrimento é o que nos leva a sentir falta de algo mais na vida, um sentido para ela, porém…
Não, ela não tem sentido.
Uma história zen conta que um monge perguntou à Buda qual era o sentido da vida. Ele respondeu: uma flor. A vida não tem sentido e enquanto você ficar buscando por ele, acredite: vai se frustrar. Acreditar que a vida tem sentido e que precisamos encontrá-lo é uma forma folgada de entender a existência. Folgada porque coloca na vida a responsabilidade que é nossa em criar sentido para ela.
A vida não tem sentido porque ela não é humana. Somos nós quem precisamos de sentido, não a vida. Nem sequer temos uma definição muito clara de quando começa a nossa vida: é quanto o óvulo é fecundado? É quando se forma o embrião? É quando ele nasce ou quando começa a dizer as primeiras palavras ou quando entende seu próprio nome?
Você vai (ou não) dar um sentido para a sua vida. Em tempos mais antigos, havia a vantagem de termos uma sociedade alicerçada em bases mais sólidas que nos permitiam saber se o que estávamos fazendo era bom ou não. Hoje em dia não, cada um, além de dar o sentido, deve também elaborar os critérios pelos quais vai avaliar sua própria existência.
Agora a pior parte: você elaborar estes critérios não significa que eles serão bons para você! Sim, acredite: você pode usar a sua tão amada liberdade e fazer uma bela porcaria com sua própria vida e mente (e só se dará conta disso anos depois). O preço da liberdade é a eterna vigilância, o fato de sermos livres para escolher qual o sentido que vamos dar à nossa vida também nos faz reféns no sentido de termos que, para todo sempre, avaliar o que estamos fazendo com ela.
Por este motivo é que precisamos saber avaliar bem o que fazemos. É algo que vai muito além de “gosto” ou “não gosto”, envolve a criação de vários critérios assim como a repercussão deles ao longo da vida (os resultados concretos e não os esperados). Precisamos criar, para sempre, porque o sentido que damos hoje precisará ser polido ao longo dos anos, muda a vida, muda a perspectiva e, com isso, o sentido que damos. É um trabalho full time, logo…
Responsabilidade é um saco, mas viver sem ela é pior ainda.
Não vou fazer odes de amor para a responsabilidade, muitas vezes é simplesmente chato e cansativo ser responsável. Isso porque a pessoa que se dedicar a encontrar respostas para os problemas da vida precisa quebrar a cabeça, deixar a preguiça de lado, se esforçar quando outros simplesmente deixariam tudo quieto. Também porque quem faz isso lida com os problemas de frente, sem deixá-los maiores ou menores do que são e fazer tudo isso buscando uma vida equilibrada dá muito trabalho.
A alternativa que é o famoso “vida leva eu” é problemática também, porque ao não ser responsável você se torna uma “vítima auto gerada”, ou seja, uma pessoa que pela opção em não responder aos seus problemas termina por se tornar incompetente para gestar sua própria existência. Com isso ela se torna uma “vítima” de várias situações que lhe causam dano, porém este vitimismo é criado por ela mesma e não pelas situações.
Assumir a responsabilidade garante a qualidade de reflexão e busca de soluções. Você pode até não conseguir resolver todos os problemas de sua vida, mas resolverá alguns com toda certeza porque geralmente é mais uma questão de insistência e esforço de que a necessidade de um dom especial dado por Deus ou qualquer outra entidade na qual você acredite.
Um dos componentes básicos da auto estima é esta a responsabilidade pela própria vida. Pessoas que não se sentem capazes de viver em geral tem baixa auto estima. Se a vida, como afirmei, não tem sentido pré definido, ela tem a necessidade de ser mantida de alguma forma. Por este motivo a capacidade de sustentação é tão fundamental para a auto estima, o organismo que não tem isso ou morre ou vive eternamente dependente de outro o que lhe priva, de certa forma, de sua liberdade. Muitas pessoas, porém, fazem esta privação de maneira voluntária e aí está algo bem nocivo.