• 10 de março de 2017

    Espelhos

    – Estava em uma discussão com meu esposo e foi muito interessante.

    – O que foi interessante?

    – Logo no começo da discussão eu me disse: “não brigue, converse”.

    – Perfeito.

    – E daí vi que ele estava querendo brigar.

    – Sim.

    – E vi, nele, exatamente o que eu vi, aqui, que fazia quando estava discutindo com ele.

    – Entendi, você viu o seu comportamento espelhado no dele?

    – Sim, isso mesmo

     

    Os outros podem ser o inferno como desejava Sartre, porém, também podem ser nosso espelho. Nesse caso, o inferno somos nós, espelhados nos outros.

    Perceber nosso comportamento espelhado no comportamento de outra pessoa, em geral, é uma ação que ocorre após termos consciência de nossa situação. Praticamente todos as pessoas que fazem terapia atingem este estado de percepção. Compreender isso como uma tendência do comportamento humano é incômodo, mas ao mesmo tempo revelador.

    Entender que é uma tendência das pessoas observarem seus pares e perceberem neles o próprio comportamento significa afirmar que aquilo que reclamamos dos outros é, na verdade, a mesma coisa que nós fazemos. Em outras palavras, ao reclamar de terceiros, estamos reclamando de nós. Diz o ditado que a mão que aponta para o outro tem três dedos que apontam novamente para nós.

    Chamamos isso de espelho. Perceber no outro o reflexo de nossas angústias e comportamentos. Esta atitude porém, não revela apenas nossa arrogância, abre espaço para a empatia. Ao perceber no outro aquilo que fazemos, também podemos compreender que os motivos podem ser próximos aos nossos. Em outras palavras, o medo da rejeição que me faz calar pode ser empático com a frieza de meu conjugue que nada diz, por medo de se magoar.

    Não se trata de uma atitude de compensação: se ele faz o que eu faço, então tudo bem. Mas sim, de compreensão de uma condição na qual duas ou mais pessoas se encontram e da possibilidade de criar novas dinâmicas mediante a empatia. Quando é possível à duas pessoas criarem sintonia a partir daquilo que temem, abre-se a oportunidade para que estas mesmas pessoas escolham não se ferir e nem ferir o outro. Desse ponto nasce o respeito genuíno.

    Assim espelhar-se não significa o alívio pelo fato de estar mais consciente daquilo que você faz. O entendimento é de responsabilidade em ter o conhecimento de sua própria dinâmica e percebê-la em outra pessoa. Quando o reflexo do outro nos toca a alma, é importante agradecermos ao invés de nos vangloriarmos. Isso deve ser feito com parcimônia, novamente: não se trata de compensação, mas de compreensão e mudança.

    Se o comportamento do outro é o meu, sua dor pode ser a minha. Se isso se verifica, a mudança do outro pode ser a minha. Mas no espelho, apenas um dos lados cria o movimento. Este lado é o que vê, logo é dele a responsabilidade em gerar reflexos novos. Espelhar-se mostra que você, agora é capaz de criar o novo.

    Abraço

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