• 24 de maio de 2017

    Porque me apego à metas impossíveis?

    – Mas eu sei o que ele vai fazer.

    – Eu também, mas é você quem insiste nisso.

    – Mas se eu não for insistir faço o que?

    – Você sabe, não sabe?

    – Ah… mas eu não me sinto bem em fazer isso.

    – Sente-se como?

    – Me sinto meio mal, meio culpado sabe?

    – Culpa pelo que?

    – Em querer sair de casa…

    – O que há de errado nisso?

    – Não sei, mas acho que ficariam brabos comigo.

     

    Muitas pessoas já passaram pela situação de saber que algo não vai dar certo, mas continuar “tentando” mesmo assim. O que impulsiona essa reação, muitas vezes, é uma compreensão infantil de mundo, que revela a imaturidade de aspectos da personalidade da pessoa.

    Quando existe uma meta impossível ou muito difícil de se concretizar, lidamos com uma noção de realidade distorcida. Esta distorção pode ocorrer por meio de uma aliança emocional e psicológica da pessoa com pessoas e/ou ideias. A natureza dessa aliança visa manter a proximidade das pessoas, cultivar a relação custe o que custar. Dessa forma, algumas metas são criadas com o intuito de nos manter dentro da família ou longe do perigo. O custo, porém é quase sempre desastroso.

    Dar-se uma meta que não é possível de ser realizada é um gasto de energia vital. Gastamos nossa vida fingindo que estamos buscando uma solução para um problema, mas não estamos. Pessoas que tentam mudar as outras configuram um belo exemplo disso. Em geral, a fantasia associada é do salvador, ou seja, aquele que vai “endireitar” o outro. A  fantasia associada é de uma bela família, uma relação maravilhosa onde todos os problemas são resolvidos pelo “poder do amor”. Só precisamos nos amar e tudo se resolverá. Esta é a fantasia.

    A realidade desse tipo de relação são anos de frustrações e brigas onde um lado dá demais e o outro não. As pessoas se polarizam em papéis rígidos e seguem rotinas de acusações ditas ou não ditas. A fantasia de que o amor une, no entanto, se mantém. As pessoas continuam juntas “pelo amor” e isso realiza a fantasia infantil. Sair dessa fantasia não é fácil, afinal de contas, crescer nunca é fácil.

    Em uma situação como esta, por exemplo, crescer é encarar o outro tal como é. Deixar de lado a missão de mudá-lo e se perguntar de maneira franca: conseguiremos construir uma relação de verdade onde ambos fiquem satisfeitos? Amar é amar o imperfeito, por esta razão a natureza das relações é troca e negociação. Porém, deixar de lado a missão de mudá-lo é aceitar o fim das fantasias infantis. Este pode ser o desafio mais doloroso para muitas pessoas.

    Crianças são rígidas. Quem já leu uma história de ninar para uma sabe que elas decoram até as vírgulas e entonações de voz. Quando elas criam suas fantasias, realmente acreditam nelas. Essas fantasias possuem valor de vida para elas, mesmo que não tenham nenhum pé na realidade. Dessa forma, quando adultos, é difícil deixar de lado essas percepções infantis porque elas despertam muito medo de retaliação.

    É importante questionar o medo de retaliação. Por exemplo, se eu deixar de querer mudar o outro, o que vai acontecer de fato? Serei uma pessoa ruim por dizer que o que me incomoda, me incomoda? De outro lado, acolher a emoção pode ser um fator fundamental para a evolução da pessoa. Ao assumir a culpa e perceber a sua natureza infantil podemos também verificar a necessidade de mudança e usar essa percepção como combustível para fazermos o que nos fará adultos.

    Crianças criam alianças e fantasias por causa das emoções mais básicas como medo e amor. Reconhecer estas emoções e intenções em nosso comportamento adulto é fundamental para crescermos. Compreender que quero mudar o outro para que meus desejos contrários à ele não o incomodem (que é uma aliança típica do “salvador”), é importante para entender que você tem o direito de ser diferente e é justamente por isso que poderá ser amado.

    Abraço

     

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