• 21 de novembro de 2019

    Quando a gente nega algo, não entende

    – Mas eu não entendo.

    – Não mesmo. Agora o que você não entende?

    – Porque eu estou sentindo isso?

    – Porque não deveria?

    – Isso é um absurdo.

    – Este é o motivo pelo qual não entende.

    – O que?

    – Você acha isso um absurdo, logo não tem como entender um absurdo, tem?

    – Faz sentido.

    Muitas pessoas querem entender algo sobre si mesmas. Elas vem para a terapia, questionam, questionam, questionam e saem sem entender nada. Me dizem: “estou confuso”. Mas o ponto aqui é outro, entender é uma coisa, aceitar, outra.

    Ocorre muitas vezes: uma situação surge, você sente algo que não gostaria de sentir e diz, internamente: “isso não deveria estar acontecendo”. A partir disso a pessoa quer “entender” algo. No fundo “entender” significa criar uma explicação para justificar o motivo pelo qual “isso não deveria estar acontecendo”. O terapeuta iniciante vai procurar uma resposta junto com a pessoa, mas nenhuma, por mais completa e embasada que seja vai lhe servir.

    Porque ela não quer entender o que está acontecendo, ela quer uma explicação que a ajude a sair do sentimento e entrar em outro “que deveria estar acontecendo” segundo a linha de pensamento dela. O problema central é a negação do que está ocorrendo e do que a pessoa está sentindo. Apenas dentro da aceitação do que está acontecendo ela poderá entender algo. O sentimento de confusão surge porque ela fica apegada à ilusão de como deveria ser – e não é.

    Sempre que negamos algo nenhum entendimento é possível, porque jogamos fora todos os fatos. Sem fatos não há como entender nada. A questão é que geralmente, estes fatos reais apontam para algo que a pessoa não quer, não gosta ou sente que é inapropriado. Assim sendo, ela mantém a esquiva e deixa de entender o que ela realmente sente. Não é fácil, você passa uma vida nutrindo uma imagem sobre você mesmo e, de repente, sua experiência lhe mostra que você não é assim.

    Aqui entra a coragem e a humildade. É preciso coragem para enfrentar isso, pois é como um estranho entrando em nossa casa. E muitas vezes um estranho feio e fedido – pelo menos aos nossos olhos. Normal buscar o afastamento. Ao mesmo tempo, o que perdemos? Nossa autenticidade. Perdemos a verdade sobre nós mesmos. Ganhamos a ilusão, mas isso não nos serve muito tempo. A coragem é o que nos faz sentar do lado do estranho fedido e conversar com ele.

    A humildade é a capacidade de aceitarmos que não sabemos tudo sobre nós mesmos. Muitas vezes a arrogância em manter uma imagem é mais forte do que nossa capacidade de lidar com a realidade. Isso nos cega. A humildade é necessária, pois é com ela que nos acostumamos a ver o que é e não o que queremos ver. Essa diferença é fundamental em relação ao desenvolvimento pessoal. Quanto mais olhamos para quem somos tal como somos, mais nos abrimos a nossa verdade, que nem sempre nos é doce.

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