• 6 de janeiro de 2020

    Quando é importante “não falar”?

    – Agora eu acho que entendi Akim.

    – Sim, me parece que sim.

    – O que eu faço com isso agora?

    – Nada, apenas fique com esta percepção.

    (próxima sessão)

    – Foi bom não ter falado muito sobre o que eu percebi semana passada.

    – Sim.

    – Eu entendi algumas coisas sozinha e isso foi importante.

    – Perfeito. Continue com isso aí dentro. Não é necessário ou importante falar sobre isso agora.

    Existe um fenômeno estranho e interessante em psicoterapia. Trata-se de algo sutil que eu, particularmente, chamo de “força”. Algumas vezes, ao falar sobre um problema, ganhamos força. Porém, em alguns casos perdemos. Todos já passaram por esta situação na vida e é importante saber olhar para isso como uma realidade afim de manter suas forças para o que realmente importa.

    Para compreender melhor isso é importante deixar claro que a fala é importante para nossa saúde mental. Várias pesquisas já demonstraram que o ato de conversar sobre um problema tendo auxílio de um psicólogo que saiba como ordenar a fala da pessoa tem um valor tão alto quanto e em vários casos mais alto e duradouro do que medicação. A fala nos ajuda a organizar nossa percepção interna. Ouvir aquilo que dizemos, muitas vezes nos faz perceber nossas verdadeiras intenções e repensar aquilo que estamos fazendo e sentindo.

    Então, quando a fala nos auxilia a organizar o conteúdo interno, aliviar o excesso de tensão, compreender nossas intenções, estabelecer um curso de ação, ela nos faz fortes. Por outro lado, a experiência em clínica (e na vida) também nos apresenta para casos nos quais a fala enfraquece. É o típico caso de quando a pessoa nos conta uma história esperando uma resolução de nossa parte. Quando a pessoa fala de sua situação querendo entregá-la a outra pessoa, isso a enfraquece. Pois a faz vítima de sua situação e torna o outro o detentor da solução. Privar-se da responsabilidade nos enfraquece.

    Outra situação muito comum, porém um pouco mais sutil é quando algo é compreendido pela pessoa. Existem situações em que o trabalho terapêutico nos leva a perceber e criar soluções e percepções sobre nossa forma de funcionar. Nesses casos, falar sobre este conteúdo pode ser contraprodutivo. Gosto de comparar isso com abrir o forno quando um bolo ainda não está pronto. Em muitos casos isso destrói o bolo, porque ele ainda não estava “pronto” para ser visto (e muito menos comido).

    Não damos muito valor hoje em dia para a palavra “maturação”. Porém, ela é de fundamental importância para a vida psíquica. Vários assuntos do nosso dia a dia e de nossa realidade interna precisam ser maturados antes que possam se tornar – de forma produtiva – verbo e ação. Ao agira ou falar de algo “antes do tempo” corremos o risco de danificar um processo. Ocorre que desejamos ver mudanças no mundo físico e, muitas vezes, ficamos ansiosos com isso. Porém, muitas mudanças são mais importantes no mundo subjetivo do que no concreto em específico. Às vezes a ação concreta é secundária.

    Neste tipo de caso estamos falando de uma mudança de atitude, de motivação ou até mesmo de identidade de parte da pessoa. Neste sentido é importante cuidar com aquilo que falamos. Guardar uma percepção pode ser importante, pois nos permitimos um pouco mais de tempo para nos habituar a ela. Não se trata de ficar pensando e repensando, não é nada disso, ruminar tem efeito contrário. É o que se chama de internalizar. Não se discute mais a conclusão, apenas ficamos atentos à ela. É como colocar um quadro novo na sala e ficar contemplando ele mais tarde. Preste atenção aquilo que você quer falar e porque quer. Sempre se pergunte se a fala é realmente importante ou se é apenas uma válvula para desabafar e se livrar de algo que tem que ficar com você.

    Abraço

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