– Eu não sei direito o que está acontecendo. Me sinto distante entende?
– Sim. Você percebe que está distante de algo?
– É… não é bem isso… é… eu não quero fazer nada, quero só… como se quisesse fugir da minha rotina entende?
– Sim. Você não quer ficar ali, não quer fazer o que há para ser feito. A pergunta é: estar ali é de alguma forma agressivo ou é algo que lhe parece não ter sentido?
– A segunda.
– Perfeito. Então vamos olhar para isso: o que tira o sentido da sua rotina?
– Não sei direito…
– O que você sente com esta pergunta?
– Medo… estranho sentir isso…
Nem sempre aquilo que nos motiva a buscar a terapia é claro para nós. Pensamos que sabemos localizar o problema, mas, geralmente, ele é apenas algo que nos chama a atenção para o problema de verdade. Este, porém, não é fácil de ser visto. Não porque não sabemos dele, mas porque existe um preço para olhar aquilo que nos incomoda.
Tendemos a ver nossos problemas como problemas do presente. Algumas vezes isso é verdadeiro, afinal de contas, nós evoluímos, aprendemos novos comportamentos e nos colocamos em situações novas. Porém quando se trata de temas mais estruturais, em geral, o comportamento se forma nas fases finais da infância e começo da adolescência. Lá, naquela época, é que determinamos o sentido e motivação de muitos de nossos comportamentos. Esse, muitas vezes, é o problema.
A tendência do comportamento é buscar a especialização e não a mudança. Isso significa que quando pensamos em uma forma de agir, geralmente queremos torná-la cada vez mais forte. Se de um lado isso é o que nos faz crescer e nos tornar íntegros, de outro, é importante sempre ter em mente que a mesma fórmula vale para o que é funcional e disfuncional. Logo, olhar para aquilo que motiva nosso comportamento é abrir-se para o fato de que nem sempre estamos certos sobre o que fazemos ou que precisamos deixar algo de lado para continuar vivendo.
O preço em olhar consiste em aceitar a realidade de nossos comportamentos ao invés das explicações que damos sobre eles. Não se trata de “saber de algo”, boa parte dos clientes que acompanham me dizem que de certa forma “já sabiam” de seus problemas, o difícil era aceitar isso. E porque é difícil? Porque queremos proteger nossos comportamentos e decisões antigas. Tendemos a justificar o que fazemos ao invés de ver que os resultados no presente não são adequados para nós. Com isso trocamos o real pelos pensamentos. O preço de olhar é que deixamos a realidade nos tocar, nua e crua.
E então, o que vemos? Vemos a realidade. O que, de fato, meu comportamento está me trazendo? Qual o comportamento (ou a cadeia de comportamentos) estou tendo e o que, de verdade, isso faz? O que se vê é um ser que está sujeito às “leis” do mundo e não acima delas. Uma pessoa que age e colhe consequência, e então, olhamos para estas consequências e não para uma interpretação delas. E com isso colhemos o que realmente plantamos e não aquilo que desejávamos plantar.
Isso é o que nos incomoda de fato. As reclamações que trazemos à terapia geralmente, são postas de forma a evitar a nossa responsabilidade sobre elas. Porém, quando tiramos a venda de nossos olhos, começamos a ver nossa responsabilidade e entender que precisamos mudar nossa forma de agir para ter novos resultados. Nos colocamos dentro da experiência daquilo que ocorre ao invés de ficar de fora apenas reclamando do mundo e dos outros. Este incômodo é duro e difícil de ser sentido, porém é o que nos impulsiona a ir adiante.
Abraço