– Eu não quero mais sair de casa!
– Sim, imaginei. O que te motiva a não querer sair de casa?
– Ah… não saio mais e não preciso mais ficar dando murro em ponta de faca.
– Como assim?
– Essas coisas de sair e ter que ficar com alguém… é muito chato e complicado.
– “Ter que ficar” sim, mas “querer” é outra história.
– Sim, mas eu não quero!
– Não quer, ou está com medo de não ficar?
– Ah, você sabe.
– Eu sei e você também.
O desejo de não sentir dor ou frustração nos impele a sair de perto daquilo que nos causa essas sensações. Porém a fuga é um comportamento que tem eficácia limitada. Evitar as situações difíceis, de um lado, pode nos ajudar a não nos sentir frustrados, mas por outro impede nosso crescimento pessoal.
Acontece que o desejo de não sofrer tem como motivação comportamentos de fuga e evitação. Quando nos comportamos desta maneira, tendemos a colocar o foco naquilo que não queremos e buscar evitar situações e comportamentos que nos levem em direção àquilo. Porém a tendência do comportamento é de se especializar. Assim sendo a maneira e o rigor com o qual nos afastamos tendem a se tornar cada vez mais refinados.
Este refinamento é o que pode “acabar com sua vida”. No primeiro momento a fuga e evitação fazem com que a pessoa tente evitar determinados comportamentos e ambientes que levam diretamente ao problema. Por exemplo: se tenho medo de paquerar, posso começar evitando o comportamento de flerte, posteriormente, evito ir à lugares onde ele pode ocorrer. Mas como este comportamento de evitação “é eficaz”, por fim, no mesmo exemplo, tento evitar o contato com pessoas do sexo oposto e, ainda mais: com todas as pessoas.
A “eficácia” da esquiva é colocada entre aspas porque este comportamento é eficaz em relação à evitar a dor. Existe uma diferença, contudo entre evitar a dor e conquistar formas elaboradas de lidar com uma situação. No exemplo acima afastar-se da possibilidade de flertar com alguém é diferente de aprender a paquerar e se entregar. Logo, a pessoa não se torna mais adaptada ao esquivar-se e sim menos. Por esta razão e pelo fato da esquiva gerar um pequeno prazer pelo afastamento da dor é que a pessoa passa a querer aplicá-la cada vez mais.
Porém o problema é que não é possível fugir de algumas situações para sempre. O desejo de flertar, por exemplo aparece novamente na vida da pessoa. O que se faz então? A pessoa passa a evitar seus pensamentos e por fim, seus próprios desejos. Ao chegar neste nível é que a evitação pode comprometer seriamente a vida da pessoa que passa a apequenar-se cada vez mais com o intuito de escapar da dor, ou da possibilidade de qualquer coisa nela que a faça desejar ir para algo que possa lhe aproximar da dor.
Como se pode ver o afastamento nos faz, primeiramente, nos desligar de comportamentos e ambientes para mais tarde nos alienarmos de nós mesmos. A vida, neste sentido não vale a pena ser vivida e as pessoas que chegam a graus tão grandes de evitação tendem a entrar em depressão ou sentir transtornos de ansiedade pelo fato de se sentirem perseguidas o tempo todo. Além da auto crítica exacerbada que também segue este perfil, a evitação como a única forma de reação sempre se mostra uma saída ineficaz.