– E quando ela me disse que não sabia se eu gostava do meu trabalho, eu parei para pensar que ela talvez tivesse razão.
– Deve ter sido chocante para você isso, não?
– Está sendo ainda! Porque eu tenho tudo o que eu quero de lá.
– Tudo? Será? O que você tem de fato?
– Bem, eu ganho muito bem não?
– De fato! E daí?
– Como assim e daí?
– Ganhar muito é uma coisa, agora se o que você tira do seu trabalho alimenta tua alma, é outra.
– Isso é complicado para mim.
– Sim, lembra-se de uma vez que você foi ajudar um amigo na mudança dele?
– Sim, foi muito bom ter feito aquilo. Na época eu nem entendia direito porque, mas foi.
– Sim, o tema que você está trazendo tem a ver com isso. Não é sobre o dinheiro, isso está ok, mas sim sobre o sentido que o trabalho tem ou não para a sua vida.
– Entendi…
O fazendeiro quando planta, cuida de sua plantação. Ele não o faz apenas por amor às plantas que tem, mas porque ele também irá comê-las em determinado momento. Ele se doa ao trabalho quando cuida das plantas e também toma algo do trabalho, algo que serve à sua vida. Porém, muitos de nós vivemos uma vida laboral na qual aquilo que fazemos tem como resultado apenas o dinheiro.
Quando o trabalho “apenas paga as contas”, ele rapidamente se torna maçante. É difícil a pessoa sustentar a vida dessa maneira. Porém, isso não é uma característica do trabalho em si, afinal de contas o que muitas pessoas consideram um trabalho “chato”, outras consideram super interessante. A questão é se a atividade desempenhada está relacionada com as motivações da pessoa. Colocar a questão dessa maneira, no entanto, é torná-la passiva demais: o ponto é se a pessoa está conectada com sua vida e com aquilo que a motiva e de posse disso olha para o trabalho.
É importante fazer uma diferença entre a perspectiva psicológica e emocional com a qual olhamos o trabalho e as reais condições de trabalho. Sempre gosto de pensar em Nelson Mandela que, ao sair de um cárcere de 25 anos disse que não ficou preso 25 anos, passou este tempo se preparando para governar seu país. É óbvio que ele sabe que ficou preso, porém a perspectiva com a qual encarou isso é surpreendente. Isso também não significa que não se deve buscar melhores condições, mas sim, saber que mesmo com elas, a pessoa deve ter a sua perspectiva sobre o que é o trabalho para si.
Percebo isso no outro oposto do espectro: as várias pessoas milionárias ou com altas rendas que deprimem, não sabem o que querem da vida, não conseguem ir adiante ou usar seu dinheiro e trabalho para algo que as faça felizes. É importante compreender que a perspectiva com a qual olhamos o trabalho é individual e se relaciona com a realidade, mas não é definida exclusivamente por ela. Assim sendo, volto à questão: quanto você está conectado com a sua vida?
Esta é a questão que nos faz olhar para o ânimo. Se você não está animado, provavelmente não está conectado com a vida em si. E isso não tem a ver com as atividades que você faz, mas sim em como você se percebe nelas. Se é possível extrair do que você faz, um sentido para a sua existência. Este sentimento não é atrelado aos prazeres sensoriais, mas sim à sentimentos internos, mudanças na homeostase do organismo. Jaak Panksepp nos diz que o cérebro possui processo endógenos de excitação e é disso que estamos falando.
Quando a pessoa sabe se conectar com aquilo que a motiva intrinsecamente além de externamente, ela domina o uso de sua energia vital. Então o trabalho que ela faz serve à sua vida, mesmo que ela não goste do trabalho. O fato do gostar, como já falei em outros posts, trata do prazer sensorial, mas a sentido de vida que o trabalho pode oferecer fala se sentimentos internos, de mudanças homeostáticas. Então só toma algo do trabalho aquele que o direciona de acordo com sua vida, quem serve a vida em si, também buscará um trabalho que serve à esta vida.