– Eu não sei o que está acontecendo.
– Sabe sim, você apenas não gosta disso.
– Se eu sei, porque eu não faço nada?
– Justamente por causa disso. Saber também envolve aceitar algo, e você não gosta de aceitar isso.
– Aceitar o que?
– Você sabe.
– Sei do que?
– Pare e sinta o seu corpo.
– Porque fazer isso?
– Apenas sinta…
– Sinto raiva do que você está falando…
– Exato, continue em contato com essa raiva… apenas sinta isso.
(Ela se recosta e me olha com raiva)
– Não sinto mais nada.
– Perceba o seu rosto
– Não quero…
– Exato, você não quer. Está tudo bem… veja se é possível se permitir sentir isso.
– Eu não quero… é muito ruim…
– Exato… é isso o que você “sabe”, mas não consegue aceitar, sentir e, portanto, ver.
Emoções não são elementos para ser, inicialmente, entendidos, mas, sim, sentidos. Queremos fazer o caminho inverso e dizer às emoções o que elas deveriam ser, mas a verdade é que são elas quem nos dizem o que está acontecendo conosco. O medo tem uma mensagem específica, e muitos de nós não gostam de ouvir isso, porém estas mensagens são muito importantes.
As emoções não são causa, são consequência de eventos, respostas orgânicas relacionadas com temas de uma natureza muito semelhante. Aquilo que chamamos de “medo”, por exemplo, está relacionado com eventos que acreditamos ser potencialmente perigosos ou ameaçadores para nós. Em geral, o medo nos faz ter atitudes de proteção diante destes eventos afim de conseguirmos passar por eles com o menor risco possível ou até sem risco algum. É isso que nos faz colocar o capacete ao andar de moto ou uma luva para tirar uma travessa quente do forno.
Porém, em muitas famílias sentir-se desprotegido ou incapaz de avançar diante de algo perigoso pode ser visto como fraqueza ou “indisposição”. Nestes casos a pessoa pode aprender que o medo é algo “errado” ou, em si, “perigoso”. É muito comum ouvir: mas se eu não enfrentar isso, como vou crescer? A pergunta é enganosa porque em primeiro lugar traz a crença de que é sempre necessário lançar-se naquilo que nos causa medo “para crescer” e em segundo lugar que o medo, de alguma forma, impede este processo.
Logo aprende-se a ter medo do medo. É comum que as pessoas que desenvolvem este tipo de medo também tenham grande dificuldade em expor suas necessidades e perceber seus limites. Isso porque estas atitudes são “próximas” do medo, ou seja, fazem a pessoa frear e quem tem medo do medo, nunca pode frear. O trabalho é direcionado no sentido de ajudar a pessoa a compreender aquilo que motivou o medo do medo, em geral, trata-se de assumir papéis de super responsabilidade, nos quais a pessoa “tem que” ter resposta para tudo, ou seja, nunca pode titubear, logo nunca se permitirá sentir seus limites e seus medos.
Trabalhar com a noção de que ter o nosso lugar em um grupo, seja ele de trabalho, amigos e família, precisa levar em conta nossas necessidades e limites é fundamental. Muitas pessoas acreditam que não podem mostrar seus limites e necessidades à um grupo, mas se for isso, qual o sentido em pertencer? Viver em uma eterna competição para se mostrar sempre uma pessoa “invulnerável”? Esta é uma das crenças que sustenta o medo do medo. Aprender que podemos estar num grupo que nos apoie quando precisamos é fundamental (assim como aprender a achar e se soltar nesses grupos).
Por fim, o tema do medo abre a pessoa para ver algo que ela teme e sente como inadequado: suas limitações e necessidades. Muitas vezes sente até mesmo nojo de se perceber assim. Entende como “fraqueza” aquilo que é apenas um limite. Lidar com a aceitação de que todos nós possuímos limites e necessidades é importante para a pessoa aprender a cuidar de si, algo muito difícil para quem teme o medo. Finalmente repaginamos a ideia do medo como uma emoção protetora, que nos serve ao invés de nos impedir e se sentimos medo é importante aprendermos a nos defender, para então ir, mas com segurança.
Abraço