– E o que eu fiquei chateado foi que ninguém me ouviu!
– Como assim?
– Ninguém ouviu o que eu tinha a dizer.
– Mas você não me disse que falou o que queria?
– Sim, mas…
– Mas?
– Mas acabaram fazendo outra coisa!
– Hum, mas o fato de terem feito outra coisa significa que não te ouviram, ou que decidiram fazer outra coisa?
– Hum…
Muitas pessoas relatam não se sentirem ouvidas por seus pares ou pessoas importantes. Porém é sempre importante avaliar o que significa esse sentimento. O que ocorreu de fato? A pessoa não teve oportunidade de falar, não foi ouvida de fato ou apenas não teve seus desejos atendidos?
Tenho atendido muitos casos onde a última opção é a verdadeira. O fato de não terem seus desejos atendidos é lida como “não me ouviram”. E existe uma diferença grande entre “não ser ouvido” e “não ser atendido” em seus desejos. Nem sempre as pessoas sabem fazer esta diferença, porque? A confusão entre estas duas atitudes é uma das causas. Outra explicação se deve ao fato do significado que a pessoa dá ao fato de não ter sido atendida em seu desejo.
Por exemplo, o fato de não ter seu desejo atendido pode ser sentido como falta de amor do outro. É muito comum em relações simbióticas que as pessoas envolvidas entendam que o ato de terem seus desejos atendidos – assim como atender os dos outros – é um ato de amor. Assim sendo, não verem seu desejo atendido significa ser excluído da relação e isso pode ser comunicado como “não me ouvem”. Esta percepção é dolorosa e difícil de ser assimilada.
Outro ponto é quando se acredita que ter seu desejo atendido faz parte de ser aceito pelo grupo. Algumas pessoas entendem que ter seus desejos atendidos é um sinônimo de aceitação grupal. Pais autoritários geram este tipo de percepção, visto que o pai ou mãe tem seu lugar garantido “porque” todos o obedecem. Assim sendo, a pessoa entende que se a obedecerem, ela terá um lugar de pertencimento. Caso negativo essa pessoa não poderá ser aceita e isso também é doloroso.
Finalmente é possível que a pessoa tenha aprendido que concordar é executar. Assim sendo, ela não consegue compreender que é possível concordar com uma ideia, mas agir de forma diferente (e vice versa). Esta dificuldade pode lhe fazer não compreender como o grupo pode ser capaz de ouvi-lo e não executar suas ideias, ouvir é sinônimo de agir. Aqui podemos ter a noção de pertencimento também, no sentido de que aqueles que ouvem precisam mostrar que ouviram dando às ideias da pessoa, um lugar.
Porém, compreender a diferença entre estes dois elementos é fundamental. Até porque concordância não é sinônimo ou pre-requisito de cooperação. O significado também é algo importante, pois atribuímos sentidos diferentes à elementos específicos dependendo da nossa história. É importante perceber esses elementos e perguntar-se se eles realmente querem dizer isso e apenas isso, ou se é possível dar outros significados para eles.