– Eu odeio você.
– Não é só eu quem você odeia.
– Como assim?
– Você sabe do que estou falando.
(silêncio)
– Pare!
– Eu já estou parado.
– Pare com isso! Fale alguma coisa!
– O que você precisa se dizer?
– Eu não quero falar isso!
– O que?
– Eu não… não quero assumir isso…
– Eu sei…
Um fenômeno típico em terapia é a projeção. A pessoa projeta vê na pessoa do terapeuta algo que é, na verdade, seu. Assim sendo, ao longo do tempo ela descobre coisas que achava que eram do outro, mas sempre foram suas.
Uma das formas interessantes deste fenômeno é a projeção da culpa e cobrança interiores. Muitas pessoas são extremamente duras consigo mesmas. Esperam muito mais do que é possível dar, culpam-se quando não conseguem fazer isso e se permitem o chicote interior. Por vezes essa cobrança se torna tão pesada que é difícil suportar. A pressão interna cresce e existe a necessidade de colocar para fora.
Assim sendo elas projetam essa entidade opressora nas pessoas à sua volta. Pais, amigos, amantes, terapeuta, todos se tornam uma projeção da culpa e opressão interiores. É mais fácil crer que “alguém quer me causar dano” do que acreditar que eu mesma faço isso comigo. É mais fácil dizer “eu te odeio” do que assumir “eu me odeio”. A projeção da opressão é delicada de ser compreendida e geralmente traz muita dor.
A dor está na auto avaliação muito baixa que a pessoa faz de si. Essas pessoas tendem a ser explosivas, briguentas, mudam de humor muito rapidamente e querem estar sempre certas. No fundo, sentem-se dependentes dos outros e sucumbem facilmente aos anseios de terceiros. Isso tudo porque não tem força interior bem desenvolvida. A opressão e culpa as impedem de fazer isso com a qualidade necessária.
Ao invés de sentir essa dor, elas agem. Ao agir prestam atenção no comportamento dos outros, buscando ver algum sinal de dúvida ou desaprovação, não é raro “criarem” este sinal. Quando percebem isso a projeção está feita e começam a brigar com o outro: porque você me segura? Porque você não me permite ser quem eu sou? E por aí vai. Chegam até o ponto de criarem vinganças contra o terceiro por ter sido rude com eles.
Porém o ponto verdadeiro está em uma avaliação interna. Este tipo de comportamento sofre muito mais quando lhes é permitido fazer alguma coisa. Logo que a permissão vem, a dúvida chega: “o que você acha do que eu quero fazer?”. Quando algum cliente diz que me odeia e está com raiva de mim apenas digo “ok”. A raiva é da própria pessoa, em geral, é este processo operando. Este ódio ao outro, rapidamente se mostra ódio à si. E, muitas vezes, este se mostra como uma forma de compensar o outro por não ser quem ele queria que a pessoa fosse.
Ficou confuso? Então de novo: muitas vezes sabemos quem somos e o que queremos. Logo, porém, vemos que isso não faz parte dos planos das pessoas que amamos. Somos diferentes. Aprendemos a odiar e temer a diferença em nós, porque ela soa como uma ameaça de exclusão do grupo ao qual pertencemos. Mas lidar com este medo e raiva é difícil, pois, também sabemos que não há nada de errado com ele. Então, projetamos. Jogamos para fora aquilo que é nosso, pois é mais fácil assim.
Abraço