– Mas Akim, não pode ser, não tem mais nada a ver eu e ela!
– Pode até ser, mas você ainda está falando sobre ela não é mesmo?
– É verdade, mas não tem nada a ver.
– O fato de vocês não dividirem mais a mesma casa, não implica no fato da relação ter terminado.
– Mas isso é muita loucura! Você acha que eu ainda estou “me relacionando” com ela?
– Não acho, está óbvio. Você ainda tem uma relação com ela aí dentro. Não consigo ver você livre, você consegue?
– Não sei.
Relacionamentos são mais profundos do que queremos admitir. Terminar uma relação envolve vários níveis, o psicológico e o afetivo são os mais sutis, porém, os mais importantes.
Boa parte das pessoas acredita que a mera distância física ou o fato de estar com raiva da outra pessoa bastam como prova de que uma relação terminou. Porém isso não é tão simples assim. Os vínculos que criamos com as pessoas tem raízes profundas em nossa psique e afeto. Encerrar um vínculo é mais complexo do que encerrar a relação física. Os vínculos que criamos podem durar muitos anos. Sua presença desafia até a morte, e podemos manter vínculos com pessoas que já faleceram.
Este fenômeno é comum. Pessoas cujos pais ou esposos já faleceram demonstram com frequência isso. Os pais, já falecidos, continuam atuando na mente e emoções da pessoa da mesma maneira que o faziam anos atrás. Isso se deve porque criamos, dentro de nós as pessoas com quem nos relacionamos. Nós damos à elas uma voz interna, uma imagem, um sentimento e uma função. Quando lembramos de alguém, não são apenas dados que nos veem à memória, mas emoções e uma parte de nós mesmos.
Assim sendo, é com esse ser que criamos em nossa mente que o vínculo se estabelece. Por este motivo o rompimento é algo muito profundo. Não é possível haver rompimento sem haver perdão e dificilmente um vínculo se enfraquece com a raiva. O vínculo é criado dentro de nós, assim sendo é importante termos a noção de que é um trabalho interno à ser feito. O perdão é importante porque todos temos sonhos ao iniciar um vínculo, muitos deles são rompidos quando a relação chega ao fim. Assim sendo é importante perdoar.
Porém, também é importante agradecer, porque toda relação nos trouxe alguma coisa, mesmo que tenha sido apenas a possibilidade de sonhar com algo melhor no futuro. É importante agradecer a quem nos deu a oportunidade de partilhar a vida durante um tempo. Agradecer, significa dar valor à tudo o que aconteceu de bom em uma relação. Às vezes é difícil ver isso no momento em que se deseja romper um relacionamento, porém, é fundamental valorizar aquilo que vivemos.
Por fim, enfrentar a tristeza. Mesmo quando uma relação se mostra pouco saudável, a tristeza recai sobre seus participantes. Ninguém entra em uma relação sem um motivo e um desejo. Ao terminar, as pessoas também encerram aquele sonho ou desejo de alguma maneira. Assim sendo, a tristeza também é um fator importante para o vínculo ser desfeito.
Porém, vale uma ressalva sobre a ideia de “desfazer” o vínculo. A concepção comum que se tem do termo é que, uma vez desfeito o vínculo, nada mais irá sobrar sobre a outra pessoa (em alguns casos as pessoas não querem nem lembrar). Porém “desfazer” significa, na verdade, “refazer”. É impossível voltar à etapa de antes de se conhecer alguém, quando a pessoa sequer existia em nossas vidas.
Refazer o vínculo é dar à pessoa real e, principalmente, à pessoa que temos dentro de nossas mentes um novo lugar. Criar uma nova forma de se relacionar com a memória que trazemos da pessoa, da relação que tivemos com ela e de quem nós fomos nessa relação é o verdadeiro sentido de “desfazer” o vínculo.
Não há como e nem sequer é desejável “deletar” a relação ou a pessoa de nossa memória. Em primeiro lugar, pelos erros: se você não lembra que errou, não vai poder aprender com seus erros. Em segundo lugar, pelos acertos: em toda relação fazemos algo de bom, algo que vale a pena lembrar e repetir. E em último, mas não mais importante, por nossa própria identidade. Não escolhemos nada, nem ninguém por acaso. Aquilo que escolhemos nos reflete e por este motivo é importante aprender a amar isso, mesmo que seja para nunca mais repetir.
Abraço