– Me senti humilhado…
– Imagino…
– O que eu faço?
– O que você já fez com isso?
– Na hora não consegui fazer muita coisa, continuei como se nada tivesse acontecido.
– E agora, o que está fazendo?
– Nada.
– Então continua agindo como se nada tivesse acontecido?
– Parece que sim né?
– Pois é… mas se você agir assim, como vai se dizer que algo aconteceu?
– Acho que daí não me digo né?
– Não… o que você quer fazer com o que viveu?
– Quero aprender…
– O que?
– A não passar por aquilo novamente
– Não dá para dizer se você vai ou não passar por situação semelhante, não tem como prever, mas quem sabe não viver aí dentro aquilo novamente?
– É, acho que tem razão… eu até estava começando a me culpar hoje, mesmo sabendo que eu não tenho culpa nenhuma!
– Pois é… quando a gente finge de forma verdadeira a mentira vira verdade!
– Quero aprender a me defender daquilo e se tiver que passar por isso de novo que eu aja diferente! Chega de ser humilhado e ficar quieto, vou tomar atitudes!
– Perfeito!
Sentir-se humilhado e colocar-se no papel de humilhado são duas coisas muito diferentes.
Ser humilhado por alguém é estar em uma situação a qual ou na qual a dignidade da pessoa é atacada de forma cruel e sem possibilidade de defesa. É importante destacar isso, porque muitas vezes a “humilhação” é simplesmente uma falta de competência da pessoa em se defender, porém quando a possibilidade de defesa é negada por coerção a pessoa está sendo, de fato, humilhada.
Colocar-se no papel de humilhado, por outro lado, é algo muito mais sutil e que tem a ver com a capacidade da pessoa de compreender o que está acontecendo com ela, suas possibilidades de ação no contexto, a atitude e competência em tomar estas ações, com sua habilidade em manter sua integridade e com a sua auto imagem.
Os judeus nos campos de concentração são um exemplo rico para trabalhar com esta questão. Obviamente as condições nas quais eles estavam e o contexto eram não apenas de humilhação, mas de degradação da própria condição humana. Eram escravos ou pior. Muitos judeus, no entanto, não perderam a sua dignidade, mesmo em meio à toda esta desgraça, como pode?
A maior parte das pessoas que não deterioraram a sua auto estima trabalharam com os elementos que citei acima:
Compreender o que está acontecendo com ela: a pessoa coloca-se em contato com a realidade, sabe o que está acontecendo e dá a dimensão real para o que lhe acontece.
Perceber as possibilidades de ação no contexto: muitos judeus dizem que escaparam da degradação moral com o pensamento de que aquilo tudo iria terminar e quando isso acontecesse eles iriam reconstruir suas vidas. A possibilidade deles no contexto era apenas esta sonhar e manter a esperança, não culparam-se pelo que lhes aconteceu, apenas seguiam da forma que era possível (real).
Manter a integridade e a auto imagem: uma terapeuta viveu nos campos de concentração e disse que quando pegavam o seu sangue para fazer experiências ela se dizia: podem pegar, sou contra a guerra então o meu sangue vai atrapalhar vocês”. Esta forma de encarar a situação mantinha a integridade dela mesmo no meio de todo aquele caos.
A parte fundamental é a seguinte: existe uma parte da humilhação que é provocada pela própria pessoa que “é humilhada” quando ela aceita a humilhação e se coloca no papel de “ser” humilhado. Quando a sua auto imagem se transforma na imagem de um ser que pode sofrer este tipo de ação, ela não irá mais manter seus sonhos, esperanças, não vai perceber a realidade de uma forma clara, não irá se colocar no contexto de forma adequada e irá se colocar de forma à receber a humilhação.
O contra-exemplo é um que vejo muito em consultório. Dentro dos padrões de nossa sociedade um homem branco na faixa dos 35 anos com um bom emprego não é um alvo fácil de humilhação, porém na realidade vejo muitos homens com esta descrição com uma auto estima frágil que os coloca como alvos fáceis – deles mesmo – de se colocarem em papel de “passivo de humilhação”.
Para sairmos da humilhação é importante termos a coragem de seguir nosso coração. Isso significa termos nossos critérios e nossa auto imagem bem definidos para que mesmo que nos encontremos numa situação humilhante podermos sair de “cabeça erguida”.
Abraço
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