• 19 de março de 2014

    Ser diferente

    – Sabe Akim, é muito difícil para mim porque eu me percebo diferente de todos lá em casa.

    – Sei.

    – É estranho não se identificar com ninguém da sua família, uma coisa ou outra só, mas, em geral, quase nada! Sou diferente nos hábitos, comportamentos e ideias!!

    – Entendo. Puxa… parabéns!

    – Parabéns!?!

    – Sim, você é você! Quem bom que percebeu isso não é!?

    – Nossa… estou meio que sem saber o que dizer!

    – É claro que você é diferente, agora me conte: será que não está confundindo “ser diferente” com “não ter um lugar”?

    – Hum… eu acho que é isso sim… porque eu brigo muito com minha família por ser do jeito que sou.

    – Claro, e é possível que existam brigas e divergências, ressentimentos até, mas uma coisa é diferente da outra, percebe?

    – Sim.

    – Talvez até o lugar que você tenha na sua casa não seja aquele que você quer, ou o que você acha que deveria ter sido dado à você.

    – Pode ser… acho que tem a ver.

    – Pois é… mas o tema é: como viver sendo diferente mesmo? Onde existem os encaixes entre você e eles? Afinal de contas, é nisso que você vai poder aproveitar não é mesmo?

    – É… acho que sim.

    No post “diferenças” falei sobre a diferença e a aceitação da mesma. Trabalhei com o post sob o ponto de vista da relação frisando a importância da perspectiva de conhecer o outro em sua diferença. Neste post trabalharei com um aspecto diferente que é o “perceber-se diferente”.

    Ocorre que todos nós somos diferentes, ninguém é igual à ninguém essa é uma realidade humana. Perceber-se diferente, no entanto, pode suscitar muitos medos e brigas, não por causa da diferença em si, mas por causa da maneira pela qual as pessoas reagem à diferença. O medo é o primeiro passo à ser vencido. Ao perceber a diferença damos à ela significados “porque o outro é assim?”, “o que será que isso quer dizer?”, “o que isso quer dizer para a nossa relação?” e “será que isso é para nos punir, ou que ele (a) não nos ama mais?”.

    Vencer este estágio e perceber que a diferença é somente a diferença, a afirmação de uma nova pessoa com características, desejos e aspirações próprias é um dos antídotos para este mal. A presença do amor é possível mesmo que existam as mais profundas diferenças de crenças e de comportamentos, para isso basta a aceitação da diferença e o respeito. Os romanos, eram muito instintivos em aceitar as crenças de outros povos, todas as religiões tinham um lugar dentro dos muros da cidade.

    O medo deve ser vencido tanto por um lado quanto pelo outro. Quem percebe-se diferente tem o medo da exclusão, do exílio, como gosto de chamar. Muitas vezes, ao longo da história, a pessoa diferente era exilada, enviada para fora da cidade. Isso marcava a sua diferença. Porém, metaforicamente falando, o diferente já se coloca “fora dos muros” quando ele se percebe diferente. Não é uma questão de “ser mandado” embora, ele já “se mandou”.

    E é muito comum que a pessoa passe a reagir agressivamente pelo medo de ser exilada e lute contra a família ou o grupo por causa de sua diferença. “Não há um lugar para mim aqui” grita à pleno pulmões, mas o fato é que o “lugar para mim” deve ser negociado e não integrado plenamente como espera, muitas vezes, o “ser diferente”. O filho pode querer estudar bateria às 22:00 porque é um “horário inspirador”, porém o restante da vizinhança precisa dormir neste horário. Embora aceita a diferença é preciso compreender que ela deve existir num meio com outras diferenças.

    Se a pessoa compreende que isso é apenas uma adequação de rotinas e comportamentos sem acionar, com isso, o medo de ser exilado, ela pode perceber melhor as diferenças dos outros e, com isso, criar rotinas mais interessantes. Se não ficará magoado e tenderá a se exilar buscando um lugar onde “não vão lhe dizer o que fazer”, este nível de maturidade ainda é centrada no outro e causa grande ressentimento mesmo quando a pessoa consegue um lugar próprio para ela, visto que conseguir isso afirma que ela foi exilada e que nunca poderia ser aceita no seu lugar de origem. A sensação de exílio é muito triste.

    O grande passo é o de perceber a diferença como aliada do seu próprio processo e perceber em como a diferença pode auxiliar o grupo. O que da sua individualidade pode somar na organização pré-existente? Isso abre as portas para afirmar a diferença e, ao mesmo tempo, criar a empatia. Com isso a segurança de um chão aumenta e a pessoa pode desejar alçar voos para longe do ninho por escolha e desejos próprios e não para fugir de um lar que não o deseja.

    Creio que esta compreensão seja fundamental para quem “se percebe diferente” poder viver com a sua percepção.

    Abraço

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