Certa vez, um budista foi às montanhas procurar um mestre que o fizesse atravessar os portões do zen.
– Vindo para cá, passou por um vale? – pergunta o mestre
– Sim.
– Por acaso ouviu o som dele?
– Sim.
– O local onde ouviu o som do vale é onde começa o caminho que leva aos portões do zen.
“Há bondade na flor que desabrocha e beleza na que murcha. Quando você puder ver beleza e bondade em tudo que o cerca terá atravessado os portões do zen.” (do livro “Zen em quadrinhos” Tsai Chih Chung)
Nossa busca por evolução muitas vezes nos confunde. Partimos para o mundo apenas para, então, entender que o que buscávamos está já conosco. É simples e é complexo ao mesmo tempo. Quando uma pessoa me procura para, por exemplo, sentir mais paz em sua vida, ou sentir-se em paz consigo mesma. É simples: ou ela sente paz ou não sente. Não existe “meia paz”, ou “um terço de paz” o sentimento ou existe ou não existe. Ele pode, obviamente, estar misturado com outros, porém a sua presença é inegável.
Isso explica que aquilo que buscamos é simples porque envolve sentir ou não, ter ou não, saber ou não. É, nesse sentido, algo binário. Porém, chegar nesse “binário” é algo que envolve um processo que não é binário. Desenvolver aquilo que queremos envolve participar ativamente da conquista de novas competências e percepções. Algumas pessoas podem entender que foi uma perda de tempo o budista peregrinar tanto para encontrar o mestre, porém a caminhada e a conversa junto com a revelação foram a experiência que era necessária para que budista percebesse aquilo que não percebia antes.
As histórias zen são cheias dessa estrutura: demonstram uma situação que ilumina uma pessoa. Essa estrutura aponta para a obviedade do que é o zen ao mesmo tempo que aponta para a necessidade da experiência. Nada se torna óbvio sem ser experimentado. Você pode objetar dizendo que você pode refletir sobre algo, mas não seria a reflexão uma experiência também?
Estou equiparando os portões do zen com os portões do nosso desenvolvimento interior. Aquilo que precisamos buscar em nós está presente sempre, precisamos ouvir isso. Muitas pessoas, por exemplo, sentem falta de algo em suas vidas. Amigos, conjugue, coragem, paz, no entanto, ao invés de buscarem desenvolver isso, afastam-se e lutam contra isso. Tornam a falta um problema o que faz com que distorçam a sua percepção e tornem-se ainda mais infelizes.
No caso do budista da história, ele precisava ouvir o vale, simplesmente aquietar-se. Embora ávido por descobrir o que era o zen, faltou-lhe a percepção de que todo o movimento que ele fizera já era, em si, o que estava buscando. Ao se permitir “ouvir o som do vale”, ele poderia perceber esta falta e, então começar a sua jornada.
Quantos de nós tratamos o que nos falta como um problema? Não tenho amigos, não sou esperto, não tenho namorada… a falta é justamente o que nos mostra o que temos que fazer. Por mais paradoxal que possa ser a falta é uma benção porque ela, por si, dá motivo à nossa vida, empresta sentido à ela. A falta só se torna um problema quando a tratamos como algo que nos impossibilita de viver uma vida boa, mas e se ela for o propulsor de uma nova etapa em nossas vidas?
O que você precisa ouvir em sua vida?
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