• 3 de outubro de 2012

    O medo de magoar

    – Eu tenho medo de dizer isso à ele.

    – Porque?

    – Acho que ele vai ficar brabo.

    – Porque ele ficaria?

    – Porque acho que isso o magoaria… e ele fica brabo quando magoado.

    – De fato ele pode vir à ficar, mas será que ele não sabe lidar com isso?

    – Não sei, acho que não.

    – E como ele não sabe lidar com isso você tenta poupá-lo do trabalho?

    – (risos) Acabo fazendo isso.

    – Mas então ele continua sem saber, e isso não ajuda ninguém. Você, de certa forma, prejudica ele.

    – É, é verdade, embora não seja a minha intenção.

    – Pois então, como você pode começar a ajudar ele?

    – Hum… acho que como quando eu dou limites para as crianças na escola sabe?

    – Como é isso?

    – Me sinto uma educadora naquele momento e é o que eu quero fazer com ele sabe? Algo como se eu fosse “educar” ele sobre como se relacionar comigo.

    – Perfeito, isso é bem mais interessante do que se calar sempre não é?

    – É… nossa… que bacana!

    Muitas pessoas tem medo de magoar as outras. Existe uma diferença entre “não gostar de magoar” e “medo de magoar”.

    “Não gostar” tem a ver com empatia, no sentido de sentir a dor ou incômodo da pessoa e não desejar isso à ela. Algo esperado e saudável no sentido de não gostar de ver outra pessoa passando por situações duras para ela. No entanto, embora “não goste” faz quando é necessário. “Magoar” o outro, neste contexto é uma função, algo ruim, mas que deve ser feito em prol de um bem maior. É como limpar uma ferida com sabão, água quente e depois colocar mertiolate e água oxigenada: não é prazeroso, ninguém “gosta” disso, porém sabe que é o necessário, o que deve ser feito; com um pouco de cuidado e pensando no bem maior, nas vantagens que isso trará fazemos.

    “Medo de magoar” tem a ver com não conseguirmos “magoar” alguém porque não sabemos fazer isso ou não sabemos lidar com as conseqüências. No medo a “função” de “magoar” alguém se perde e tudo o que se deseja é “não criar conflito”, “não ver o outro triste”, “não ver o outro magoado”. A necessidade daquilo desaparece e o ato necessário perde o seu sentido. É como se, ao pensar em limpar a ferida a única sensação presente fosse a de dor pela dor, ou seja, aquilo só vai doer, não gerar nenhum resultado. Obviamente, quando pensamos assim, deixamos a dor de lado.

    Aqui entra o aprendizado. “Magoar” alguém – quando isto é feito pelos motivos “corretos” – é algo que tem uma função de educar, a pessoa, frustrar a pessoa, dar limites para a pessoa e isso é fundamental em qualquer relação. Se queremos “poupar” o outro, nos tornamos “co-dependentes” em relação aos comportamentos que temos com o outro. Eu me calo enquanto ele estiver sendo injusto comigo, por exemplo. Um ficará precisando do comportamento do outro e o problema é que o resultado não é nada bom.

    Pessoas podem fazer isto por não saberem como lidar com uma dada situação, por terem uma auto-estima inadequada que diga que elas tem mais é que sofrer, por terem uma auto-imagem invertida no sentido de que a opinião do outro é mais importante do que a minha sempre, podem não ter critérios adequados sobre seus desejos pessoais, podem não sabe sustentar esses critérios, podem querer ser perfeitas e podem querer ser aceitas. Outras ainda poderiam ser citadas, mas este não é o propósito aqui, estes são os exemplos mais comuns que tenho tido em consultório.

    Para cada um deles existe um tipo de direcionamento específico, no entanto, a noção de dar um novo sentido ao ato de “magoar” colocando-o com uma perspectiva de longo prazo, respeito à si e à relação e tornar claro os critérios que a pessoa usa para realizar isso são fundamentais e comuns à todos.

    Abraço

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