• 31 de outubro de 2016

    Auto desenvolvimento

    – Então Akim… me falaram para vir aqui conversar com você.

    – Sobre o que?

    – É que falam que eu sou muito nervoso sabe?

    – O que você acha disso?

    – Eu não sei… acho que não… eu não viria aqui por vontade própria.

    – Alguém colocou uma arma na sua cabeça?

    – Não.

    – Então está aqui por vontade própria.

    – É, mas é que me pediram.

    – Você sempre faz o que te “pedem”, não é capaz de decidir sozinho não?

    – Como assim cara?!

    – Ah, sim, você é meio esquentado mesmo.

    – É… não gostei do seu tom de voz.

    – Claro que não… bem, agora que você mostrou o seu esquentado para mim, o que vai ser: queres trabalhar com isso ou não?

     

    Onde termina o auto desenvolvimento? Até quando uma terapia é necessária? E se eu não tenho problema, preciso fazer alguma coisa? Essas perguntas inquietam muitas pessoas e terapeutas, a resposta para elas, embora simples, causa um impacto muito forte na maneira pela qual vemos e damos sentido à nossa vida.

     

    Certa vez um cliente me perguntou o que ele iria ganhar em assumir seus medos, eu respondi que ele não ia ganhar nada, a terapia dele, assim como a vida dele, não eram um show de talentos “eu dou 9 pra você, mas não dá para dançar”. Ele chorou.

    O choro dele não foi porque viu falta de sentido em fazer aquilo que estava se propondo, mas sim pelo contrário. Ele compreendeu o sentido em assumir o seu medo. Não iria ganhar nada, iria apenas sentir o medo que já estava ali fazia muito tempo. Talvez ele se libertasse, talvez viessem mais problemas a partir desse, ele não sabia o que ia acontecer, apenas sabia que iria sentir algo.

    Ele assumiu. Descobriu algumas coisas que não gostou sobre si e outras que achou interessante. Ele me agradeceu por não mentir para ele, por dizer à ele que nenhuma garantia viria daquele fato. Algumas sessões mais tarde essa mesma pessoa me disse que estava na hora de parar de viver a vida esperando por alguma coisa vir e criar alguma coisa com a sua própria vida.

    Evolução não é algo com um ponto fixo. Infelizmente temos uma sociedade que se habituou com alguém lhes dizendo onde devem chegar. Por isso o auto desenvolvimento está tão em voga: dá dinheiro, dizem; liberta, dizem. Assim, não há um ponto final onde a terapia termina ou onde os problemas começam. O ponto é a decisão que a pessoa assume em fazer algo com a vida que tem. Aí é quando o auto desenvolvimento começa.

    Meu cliente ainda queria algo de alguém, foi quando entendeu que ninguém lhe daria nada, que tudo o que tinha a ganhar era a própria vida que ele negava, foi que pode assumir-se e se desenvolver. Evoluir é adaptar-se melhor. No caso dos humanos, estamos numa era em que a adaptação não se dá apenas ao meio externo, mas também, ao interno.

    A capacidade de perceber o nosso interior é motivo suficiente para que aprimoremos isso.  Daí a ideia de auto desenvolvimento. Não é exatamente “auto”, mas sim, aprimorar aquilo que vemos em nós, de nós. Embora um crítico possa dizer que a introspecção não é confiável, devo dizer que, se de um lado eu concordo, de outro, preciso dizer que até agora, não temos nada melhor à oferecer.

    Mesmo gravações do seu próprio comportamento serão vistas, absorvidas e trabalhadas pela consciência que teima em se chamar de “eu”. Então mesmo com gráficos, vídeos e tabelas, ainda assim resta ao “eu” a palavra final. Se não pode-se confiar plenamente, de outro lado não há como negá-lo.

    Assim, para fechar, digo que a terapia e o auto desenvolvimento vão até quando a pergunta está em aberto. É a pergunta que nos move. Quanto maior é a capacidade de alguém em se questionar no sentido de buscar mais sobre a sua própria experiência, maior a probabilidade em evoluir. Quanto maior a descrença e o medo em fazer isso, maior a probabilidade de estagnação. Mas não se engane, pode, ainda ser uma boa vida, afinal, foi como falei: não ganhamos nada com isso.

     

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