• 12 de agosto de 2016

    Compensação

    – Mas daí eu compensei sabe?

    – O que você fez?

    – Ah, eu falei umas verdades para a namoradinha dele.

    – Hum, e de que maneira isso te “compensou”?

    – Ué, ele não me disse umas verdades? Então, fui lá e falei para ela umas também! Disse tudo o que eu acho dela.

    – O que foi compensado, de fato?

    – Ai Akim, tá, de verdade nada, mas eu me senti melhor.

    – Ah tá.

     

    O sentimento que nos leva a buscar a compensação é a perda. O sentimento de perda, porém, carrega uma armadilha que nos faz, vez ou outra trocar os pés pelas mãos e exigir compensação onde ela não se aplica.

    O sentimento de perda está atrelado à algo que era de nossa posse e foi perdido (perder a carteira), algo que não era de nossa posse, mas era importante para nós e foi perdido (a morte de alguém importante) ou algo que não era de nossa posse, mas desejávamos (perder a possibilidade de uma viagem). Mas ele também está vinculado à ilusão de perda.

    Quando ocorre uma ilusão de perda? Em geral ela ocorre quando uma pessoa se entende como submissa a alguém que “a força” a fazer uma escolha que não queria fazer ou a abrir mão de algo. A ilusão ocorre quando a pessoa julga ter perdido algo, mas na verdade está optando por não ter mais isso ou em abrir mão disso. O cenário da dependência emocional é aquele no qual isso mais ocorre.

    A pessoa dependente acredita que o outro “manda” nela ou que ela “não tem escolha” a não ser fazer aquilo que não quer fazer. Ela não percebe, por exemplo, que quando uma pessoa lhe diz “quero sair hoje”, ela tem a opção de dizer “não estou afim hoje, vamos amanhã?”. Esta falta de percepção a deixa em maus lençóis e a faz crer que ela está deixando de fazer algo que gosta ou perdendo algo que quer.

    Assim sendo, ela se ilude, achando que está sendo prisioneira de uma situação na qual ela está apenas fazendo escolhas. Esta ilusão a faz desejar compensações. Uma pessoa mais dramática tende a criar cenários irrealistas nos quais ela faz exigências desmedidas. Pessoas mais impulsivas agem tendo uma explosão em situações inadequadas e tendem a exigir razão da outra parte.

    De uma forma, ou de outra, não há uma compensação porque, inicialmente, não houve perda, houve renúncia. É importante diferenciar perda de renúncia porque esta envolve a escolha da pessoa, o que se encaixa nos casos que estamos trabalhando. A renúncia precisa ser pensada e assumida. É importante a pessoa ter consciência plena daquilo que está renunciando para não culpabilizar o outro pela sua escolha.

    Uma compensação só se torna devida quando, de fato, há uma perda. No caso que estamos trabalhando, da ilusão da perda, só há uma pessoa que pode compensar o dependente emocional: ele mesmo. No caso o que ele se deixa de dar é a liberdade de escolha. Porém, esta só é possível ser alcançada mediante a sua escolha em fazer isso. Esta escolha se concretiza no momento em que ele diz não para aquilo que não quer e sim para aquilo que quer, ou seja, quando assume tomar uma atitude integrada com o seu desejo.

    Assim sendo, neste caso, compensar não significa punir o outro, ganhar alguma coisa pelo seu “sacrifício” ou fazer outra pessoa “sentir culpa pelo que fez”, mas sim tornar-se dono do seu próprio destino e deixar de responsabilizar o outro pelo que é seu.

    Abraço

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