– Eu não sei… não vai ser bom isso.
– Não vai ser bom ou vai ser doloroso?
– Vai ser doloroso… não sei se estou pronto para isso.
– Certo. Vamos parar aqui e contemplar isso.
– Isso o que?
– A dor. Olhe para esta sensação que está aí agora em você. Apenas perceba.
– Tá… e o que eu faço com isso.
– Absolutamente nada. Apenas sinta.
[Depois de algum tempo]
– Me sinto menos mal agora.
– Certo, existe mais espaço para sentir a dor?
– Sim.
Tememos a dor. Tememos ou aprendemos a temer a dor? É claro que a sensação de dor, como o nome já diz, é dolorosa. Temos com ela a sensação de um “dano” aos nossos tecidos. Porém, mesmo assim, existem pessoas que se relacionam melhor com a dor do que outras. Qual será o segredo delas?
Dor e prazer são fenômenos completamente distintos. Eles não são opostos, tratam-se de duas coisas completamente diferentes. Prazer tem a ver com satisfação de alguma necessidade ou desejo. A dor, por outro lado, tem a ver com lesão à algum tecido. Este é o primeiro ponto à ser compreendido. Isso, porque muitas pessoas associam dor e prazer como opostos. Logo, se o prazer é “bom”, só cabe à dor ser “ruim”, afinal, são opostos. A questão da lesão, por outro lado, também não pode ser vista sempre como negativa. A aumento de massa muscular, por exemplo, só se dá através de micro lesões nos tecidos. Sem elas, não ganhamos músculos.
Aprender que a dor é algo “ruim” é diferente de aprender a sentir dor. A dor “por si só”, como eu já disse não é prazerosa, porém isso não significa que ela é má ou ruim. O problema é que nossa cultura coloca a dor como algo ruim e, portanto, procuramos sempre nos afastar dela. Com este comportamento não aprendemos quando sentimos uma dor “boa” ou “ruim”. Pode até parecer estranho isso, mas quem é acostumado a lidar com o corpo sabe muito bem que algumas dores são positivas, sinais de crescimento.
Então, de uma forma rápida: aprendemos a ter medo da dor porque a consideramos algo ruim sempre, com isso não aprendemos nada sobre a natureza da dor e muito menos quando ver se ela é positiva ou negativa. Um dos trabalhos que faço muitas vezes é simplesmente pedir para a pessoa sentir a dor, seja ela emocional ou física. Não se trata de negar a dor ou tentar fazê-la desaparecer, não. É o contrário: é realmente sentir. Esse trabalho visa ajudar a pessoa a olhar para sua dor ao invés de fugir dela. Tornar-se familiar com sua própria sensação dolorosa é uma forma de crescimento muito importante.
O principal benefício, eu posso dizer, é que a sensação de medo diante da dor se torna menor. Não é o caso de tornar-se negligente diante da dor, mas sim aprender a perceber as várias nuances da dor e como lidar com elas. Então o medo diminui porque a pessoa passa a conhecer a sua dor. Ela ainda dói, mas agora é algo conhecido, familiar e a pessoa se sente potente diante de sua própria dor. Este é outro motivo pelo qual tememos a dor: nos sentimos impotentes diante dela. O motivo é que queremos que ela suma logo, mas isso é impossível. Ao aceitar a dor e percebê-la, não desejamos mais o impossível e então a sensação de impotência se dissipa.
Por fim, tememos a dor tanto quanto almejamos uma vida só de prazeres. O prazer pode constituir-se em um vício rapidamente, aliás, todos os vícios mexem com o sistema neurológico do prazer. O prazer quando visto como um fim em si mesmo torna qualquer perspectiva de dor nociva. Porém o crescimento envolve a dor. Quem se familiariza com suas dores, aprender a sentir esta diferença. Perceber quando a dor é de crescimento e é importante aproximar-se dela e quando a mesma se refere à danos e é importante afastar-se ou lutar contra ela. Aprender a perceber a dor, na verdade, nos faz mais fortes e mais criativos. Paradoxalmente, aprender a lidar com a dor, nos proporciona melhores momentos de prazer.
Abraço