• 3 de fevereiro de 2021

    Vulnerabilidade e abertura

    – Eu estou me sentindo meio mal essa semana.

    – A semana toda?

    – Não, na verdade, depois da última sessão eu me senti bem. Fiquei assim até o domingo e depois que me senti assim.

    – O que ocorreu no domingo?

    – Nada, foi segunda de manhã… eu me sentei para o café e fiquei pensando na vida… mas não tinha nada para pensar.

    – Hum…

    – E  isso fez eu me sentir mal… como se eu estivesse fraca ou vulnerável, sabe?

    – Asim. Ao que?

    – Não sei… acho que é como se ficasse assim em relação à vida.

     

    O processo de terapia, muitas vezes tem reações que parecem adversas. Abrir-se para um tema, por exemplo, embora uma atitude positiva no sentido terapêutico, pode trazer sensações desconfortáveis como sentir-se vulnerável. Porém conseguir se sustentar em ambos os casos é importante para ir além e tratar a questão de maneira mais ampla.

    Abrir-se é uma atitude. Significa que assumo determinada atitude perante determinado tema. Por exemplo, escolher abrir-se para ouvir suas emoções é uma atitude na qual me faço sensível às emoções que sinto. Trata-se de assumir um tipo de estado psíquico que permanece comigo, é diferente de um trabalho que é específico e termina logo que o trabalho acaba. É diferente “ler um livro” e ser “aberto ao conhecimento”. Assim a abertura muda nossa forma de nos relacionarmos com o mundo e até com nós mesmos.

    É por esta razão que a abertura, assim como outras atitudes, pode trazer vários efeitos emocionais. Num primeiro momento, por exemplo, a pessoa pode se sentir aliviada, e num segundo triste ou raivosa. Ocorre que ao nos abrirmos, mudamos nossa relação com algo, por exemplo, ao me abrir para sentimentos, posso, no primeiro momento, sentir um alívio – pois agora não vou mais me esconder ou tentar suprimi-los – porém, no segundo momento, começo a me dar conta de que não sei o que fazer com vários sentimentos, e me sinto amedrontado ou triste.

    A abertura “traz conteúdo à tona”, ou “aguça nossa percepção”, com isso, coisas que antes “não víamos” começamos a ver. Esta visão nos faz sentir muitas coisas que antes não sentíamos porque ignorávamos o estímulo, tentávamos deixá-lo de lado. E este é o sentimento de vulnerabilidade, pois tentávamos ignorar porque temíamos de alguma maneira e em algum grau aquilo que procurávamos deixar longe de nossa percepção.

    Algumas pessoas dizem: “agora pareço mais frágil”, porém a frase mais “real” é: “agora me percebo de minha fragilidade”. Pois isso é um fato, aquilo que ignoramos, tende a ficar “mal resolvido” e quando passamos a ver novamente, nos vemos vulneráveis  novamente, porque sempre fomos. Porém a abertura também nos oferece a possibilidade de “resolver” o problema, de aprender e superar a situação contra a qual nos fechamos. Abrir-se para o problema também é abrir-se para a solução.

    Suportar a vulnerabilidade e a abertura nos ajuda a tratar o tema de maneira mais ampla e significativa. Se torna possível perceber o que nos amedronta e como nos amedronta. Esta percepção é o que nos mostra, também, onde precisamos crescer e aprender. Se a pessoa, então “se abre” para o aprendizado, então seu medo assume nova representação: de algo a ser esquivado para um guia da mudança. E essa é uma imagem muito bonita: ao nos abrirmos para aquilo que nos parece monstruoso, aprender a ver as possibilidades de aprendizados, crescemos com o monstro.

     

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