– Mas é que eu não quero mais estar lá.
– E como sabe disso?
– Eu não estou mais gostando de lá.
– E isso é um motivo?
– Sim.
– O que te faz não gostar mais de lá?
– Bem, ando entediado com o trabalho e as pessoas.
– E isso é um problema do local de trabalho ou da sua forma de se relacionar com ele?
– Não sei…
– É bom pensar sobre isso então.
Qual a diferença entre ser livre e não saber se comprometer? Nossa sociedade tem uma associação falsa da liberdade com um estado onde apenas existe o prazer e sensações positivas, partindo desta ideia, muitas pessoas abrem mão de coisas importantes porque elas trazem incômodos consigo e este é o ponto de partida para compreender a diferença entre liberdade e falta de compromisso.
Existe uma ideia em nossa sociedade de que precisamos lutar por nossa liberdade. Esta ideia cria a noção de que inicialmente não somos livres. Isso também nos faz criar uma ideia do que seria ser livre. Em geral, quando se faz este exercício a pessoa deposita neste momento várias coisas que ela não quer mais: obrigações e responsabilidades, por exemplo. E então se revolta contra o mundo que a “obriga” a se deparar com isso. Compreende, então, que se ela se livrar disso, será livre. Logo, tudo o que lhe trouxer sentimentos que ela não quer sentir é algo que é entendido como se opondo à liberdade.
Porém, é um fato marcado e explorado pela literatura existencialista de que a marca fundamental da liberdade é, de fato, a angústia. A liberdade não promete prazer ou sensações boas, ela promete apenas a possibilidade da escolha. Aliado à isso, existe também a percepção de que não há uma escolha certa predefinida, sendo assim o ato de escolher além de ser solitário é, também, incerto e isso é liberdade. Logo, fica evidente que se abro mão de uma escolha apenas porque ela me incomoda, não estou exercendo, necessariamente, a liberdade. O contrário é verdadeiro: posso estar “abrindo mão” dela ao fazê-lo.
A noção de compromisso, envolve a liberdade. Ao escolher, me comprometo com algo. O conceito, dito de forma poética, significa colocar a alma (ou o coração) naquilo que se faz. Comprometimento, no entanto, não significa ser cego ou manter a escolha “a todo custo”. Este conceito depende de uma avaliação “racional” para se manter. O imaturo se compromete sem pensar, o maduro não e é apenas neste segundo caso que temos um exercício pleno da liberdade.
Comprometer-se, significa, portanto, perceber aquilo que a escolha trará de bom e de ruim, suas virtudes e desafios. O comprometimento nasce da percepção de que as escolhas, mesmo as que mais queremos e gostamos, podem trazer problemas e é aceitando isso que a pessoa se compromete, ou seja, sem ilusões de que tudo “será perfeito”. A falta de compromisso nasce justamente quando temos escolhas imaturas, ou seja, quando escolhemos buscando uma opção que “não nos traga problemas”, ora, isso é impossível e é por isso que quando buscamos por esta opção estamos nos afastando da liberdade.
À rigor, somos livres para escolher algo impossível também, assim sendo, buscar por esta escolha não implica necessariamente na falta de liberdade. O ponto que trago é que ao fazê-lo a pessoa confunde liberdade com o que ela não é: uma fórmula que se for seguida à risca eliminará seus problemas e angústias (ela é o oposto disso). Neste sentido é que ela “perde” sua liberdade: por associá-la a um efeito que não lhe é necessário e muitas vezes, contrário. A liberdade requer angústia, aceitação da realidade e do que a realidade nos traz como consequências daquilo que escolhemos.
Portanto, falta de compromisso é que temos quando, diante dos problemas enfrentados, tentamos sair da escolha feita anteriormente levando em conta apenas as sensações negativas que sentimos. Compromisso envolve recursos para lidar com problemas, angústia e situações difíceis que nossas escolhas nos trazem. Aquilo que nos faz abrir mão de uma escolha, quando pensamos em compromisso é quando a atividade exercida não mais nos leva em direção aquilo que o que nos comprometemos, pois, neste caso o envolvimento perde o sentido.