• 22 de março de 2021

    Mas eu não tenho nenhum grande problema

    – Mas a minha relação com meus pais é boa Akim.

    – Imagino, você sempre relata que gosta muito deles.

    – Então o que você fica insistindo nisso?

    – Porque existe uma questão sua com eles sobre este tema.

    – Mas a gente não tem nenhum problema grande Akim!

    – Claro que não, problemas não precisam ser grandes, precisam?

    Muitas pessoas acreditam que um “problema” tem que ser algo grandioso ou que aquilo que as incomoda tem uma origem muito nefasta ou então não estariam em terapia. A questão é que os problemas que temos não precisam assumir formas dramáticas para que atrapalhem a nossa vida e também não precisam atrapalhar nossa vida ao ponto de torná-la insuportável para existirem.

    O ponto é que muitas vezes, as pessoas que insistem na ideia “não tenho grandes problemas”, simplesmente não querem falar sobre nada que está dando errado, ou então já possuem uma ideia pré concebida sobre o porque algum aspecto de sua vida não está dando certo, neste caso, desejam do terapeuta uma confirmação sobre sua hipótese. A compreensão de que os problemas precisam ser grandes é, em vários casos, uma  defesa contra a própria ideia de que talvez elas tenham algum tipo de problema.

    Esta caso comum é quando a pessoa possui um ideal de perfeição ou, então, a noção de que ela é muito boa. O contrário também pode ocorrer como quando a pessoa sente muitos problemas e angústias, mas não deseja olhar para isso. Nestas dinâmicas é possível que ela crie uma imagem muita dramática de “pessoas com problemas” e, obviamente, não se identifique com elas. Mutias dessas imagens podem chegar até a serem irrealistas, de modo que ela não poderá mesmo se identificar com isso.

    Assim sendo, o caso é compreender que os problemas, de fato, não precisam ser “grandes”. Na verdade na maior parte das vezes não são. Tratam-se de relações comuns que simplesmente geram efeitos e estes, em algum momento, podem nos atrapalhar. Quando a pessoa deseja ou percebe que seu modo de viver lhe atrapalha, ela deseja a mudança. Há medo em dizer “tenho um problema”, pode-se dizer: “quero uma mudança”. O ponto é que assumir aquilo que atrapalha é um fator estressante e que causa medo e ansiedade para a pessoa.

    Compreender isso, nos ajuda a entender que não adianta insistir em mostrar que a pessoa possui algum problema, mas sim ir mostrando aos poucos aquilo que realmente aparece. Uma mistura entre mostrar e afastar é necessária para a pessoa conseguir superar o medo que ela tem da imagem de “pessoa problemática”. Se ela assume que tem algum problema para tratar fará uma análise tão negativa de si mesma que ela não conseguirá suportar. Assim sendo mostramos algo e mostramos o quanto isso é “normal”, e que mesmo assim ela pode querer mudar isso.

    De certa forma este tipo de demanda também possui questões culturais bem presentes. O preconceito mais comum é em relação à depressão que é entendida como “frescura” por muitas pessoas ou “falta do que fazer”. Assim, a pessoa, sem perceber, assume para si este preconceito contra dificuldades emocionais e psicológicas e tende a não conseguir enxergar isso em si, tentando desesperadamente fazer com que tudo se torne uma questão de lógica, um problema a ser resolvido com a razão.

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