– Eu não sei, mas quero parar a terapia mesmo assim.
– Entendo. Você sabe que ainda há coisas para trabalhar certo?
– Sim.
– Muito bem, vamos seguir o seu movimento. Já deixei claro os pontos que ainda precisam de trabalho, você verá quando vai lidar com eles.
– Sim, em algum momento vou fazer isso, mas não agora.
Talvez um dos pontos mais difíceis para quem trabalha com psicoterapia seja o momento no qual uma pessoa resolve parar o tratamento sem estar “plenamente” resolvida. Neste momento, saber olhar além dos protocolos de atendimento e perceber o processo da pessoa como um todo é fundamental – para cliente e terapeuta.
O tratamento em psicoterapia é algo que não envolve um protocolo pré estabelecido. Embora busquemos através da prática e das pesquisas ver o que realmente funciona, nunca podemos saber com 100% de certeza o que irá ocorrer ao longo de um processo terapêutico. Até porque nunca sabemos ao certo o impacto que as mudanças terão na pessoa. É um erro supor que as pessoas querem, logo cedo, “aquilo que é melhor” para elas. O terapeuta mais experiente entende que o conceito de “melhor para ela” é muito relativo e não se aplica nas funções práticas da vida.
Daí que muitas vezes experienciei pessoas que resolveram parar seus processos justamente nos momentos em que estavam mais próximas de algo bom para elas. O costumeiro é entender isso como resistência e ponto. Porém, se olharmos mais além vemos que a jornada nem sempre é linear – como querem muitos terapeutas. As pessoas que se colocam na jornada heroica, muitas vezes precisam ver a jornada para mais tarde se decidirem por ela. É assim que vejo hoje, quando a chega ao consultório, muitas vezes a pessoa não viu do que se trata a jornada, e quando vê, ela precisa de um tempo para respirar.
E nesse momento, suspende a terapia. Isso faz parte das jornadas. O herói ou a heroína dizem “não” para a aventura, pois ela assusta. E porque não assustaria. Quando olhamos a nossa aventura é que realmente descobrimos algo fantástico: “podemos melhorar e vencer”, e ao mesmo tempo, algo terrível: “só tenho esta vida, e logo vou morrer”. Pois é disso que trata a terapia em um senso mais profundo: a vida que levamos e a morte que teremos. Todas as terapia tratam disso, por este motivo não é fácil fazer terapia.
Não é um olhar fácil, pois exige confiar no processo da pessoa. Aceitar o destino que cada um de nós possui nem sempre é uma tarefa fácil, mas o terapeuta de um lado precisa acreditar na mudança e de outro não pode se envolver na mudança, ou a fará pelo paciente e isso não é terapêutico. Assim sendo é um desafio de ambos acreditarem em algo maior: no processo que se formou enquanto a terapia ocorreu. Somente quando conseguimos criar esta confiança é que podemos aceitar tranquilamente o fechamento de uma fase de terapia.
Respeitamos o processo quando sabemos que algo atua que é maior do que o cliente e o terapeuta. Não se trata de algo místico, mas sim de um processo psicológico que segue uma “revelia” daquilo que consideramos linear e assume formas inesperadas. Quando entramos em contato com isso, percebemos uma inteligência que quando é ativada na pessoa faz coisas de maneira automática, inclusive o afastamento de um processo de terapia para uma posterior investida com mais sabedoria rumo à mudança.