• 22 de junho de 2020

    Sentimento de aprisionamento

    – E se ele aceitasse isso?

    – Bem, não sei, acho que talvez desse certo.

    – E se pedisse algo?

    – Ah Akim, daí não dá…

    – Qual o problema aqui?

    – Ele querer coisas sabe?

    – Bem, você quer coisas, mas não vê isso como inadequado, não é?

    – Mas é diferente.

    – Concordo, o que é diferente?

    – Não sei…

    É um drama comum para muitas pessoas o desejo de estar próximo e ao mesmo tempo sentir-se sufocado quando isso ocorre. A dinâmica interna que proporciona este tipo de experiência é difícil e perniciosa, mas conhecer sua origem sempre é importante.

    Imagine que você sente, profundamente e, talvez até inconscientemente, que precisa dos outros. Que sem ter alguém do seu lado, de alguma forma, sua vida irá ruir. Agora imagine também que você acredita que se você expressar aquilo que é importante para você, é possível que você magoe estas pessoas e perca o apoio delas. Qual o resultado desta mistura de dores? Um resultado comum é que a pessoa que tem este tipo de crenças identifica os outros como manipuladores que podem lhe tirar a liberdade (visto que ele se percebe dependente deles e que não pode desagradá-los).

    Ocorre que a pessoa, então, gera um sentimento de ressentimento diante de quem ele posiciona como figura de autoridade e poder. Note que é a pessoa que dota outro deste poder, em algumas situações esta dinâmica está um tanto óbvia, mas em várias outras é apenas uma percepção criada pela crença. Uma vez ressentido com aqueles a quem atribui poder, a pessoa tenderá a ter um comportamento que se presta ao contato e atende às “demandas”, porém o faz de maneira indireta e provocativa.

    Internamente, a dinâmica funciona assim: em um momento o que “aperta” é a necessidade de sentir-se amparado, então a pessoa se aproxima da outra. Porém, na medida em que faz isso, o alarme contra “perder sua autonomia” começa a soar. Assim a pessoa aguenta até certo ponto esta angústia e depois se afasta. Mas no momento em que começa a se afastar o alarme da necessidade dos outros começa a aumentar o volume outra vez. E este ciclo se repete vezes sem fim.

    Tanto pior quando se tem uma pessoa que apoia do outro lado e uma pessoa que “realmente” precisa do outro. Pois, neste caso, a imagem criada pelas crenças disfuncionais se tornam reais. O sentimento de aprisionamento, não é real, mas sim, construção de uma imagem na qual a pessoa não pode se expressar, ou seja, a pessoa entende que “depender” é igual a perder a autonomia. Como somos seres inter dependentes, torna-se muito difícil se relacionar, pois cada vez que a pessoa se sente mais profundamente vinculada à outra, ela se afasta.

    O desejo de “liberdade” é, na verdade, uma fuga aqui, pois a liberdade é vista como a ausência de compromissos, de solicitações e demandas dos outros. Porém o exercício da liberdade através da escolha é exatamente o oposto: aceitação de compromissos e limites, o ato de renunciar de forma consciente e voluntária. A autonomia se conquista na medida em que sabemos o que abrimos mão e pelo que o fazemos e não na medida em que sempre temos tudo o que queremos.

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