– Eu não gosto de ficar triste assim.
– Entendo, mas será que isso é apenas tristeza?
– Eu não consigo fazer nada o dia todo, fico só pensando em tragédia…
– Por isso mesmo… você já teve alguma morte na família?
– Só do meu cachorro.
– Como se sentiu?
– Nossa… era uma dor no peito… eu gostava mesmo do bichinho sabe? Eu que quis e eu cuidava muito dele.
– E essa dor é parecida com a dor que você sente agora?
– Pensando bem… não é a mesma coisa não… é diferente.
Não. Embora uma pessoa com depressão possa sentir-se triste, o fundamento da depressão não tem a ver com esta emoção. A questão desta doença é muito mais profunda e tem a ver com crenças sobre si, sobre o mundo, uma história de vida e comportamentos que criam este estado de humor.
A tristeza, diferentemente da depressão, é uma emoção. Ela tem começo, meio e fim (ou seja, não dura anos), envolve, em geral, uma perda “concreta”, ou seja, ela tem um objeto definido ou que pode ser definido com mais facilidade do que a depressão. A tristeza possui uma sensação de dor, enquanto que a depressão, geralmente dá um sentimento de vazio e o embotamento das emoções (não sentir nada) é mais comum do que sentir algo.
É muito importante separar as emoções dos transtornos de humor. Humor é diferente de emoção, embora possa envolver a emoção. Para manter um estado de humor, crenças precisam ser ativadas, uma série de comportamentos disfuncionais precisam estar presentes e a pessoa, em geral, tem um tipo de histórico específico para determinados transtornos. Um dos pontos fundamentais na depressão é falta de uma perspectiva futura positiva. Quando a depressão está ativa, crenças de falta de capacidade pessoal e de que o futuro será pior que o presente estão sempre ativadas.
Estas crenças tendem a minar a energia de investimento em atividades no mundo que a pessoa possa desejar ter. Trocando em miúdos: “se vejo que o futuro será pior que o presente, porque insistir?”. O que a faz ter comportamentos inadequados que podem “confirmar” a tese. Por exemplo, a pessoa não estuda para as provas, tem uma nota ruim e diz para si: “eu sabia que isso ia acontecer”. A crença é sentida como “verdade”, por este motivo é tão difícil confrontá-la.
Outro ponto importante é a dificuldade em manter estados “positivos” como alegria e orgulho. Como a pessoa possui crenças profundas sobre ser incapaz tem a tendência de ver eventos positivos como de curta duração e também como “sorte”. Assim sendo, ela acaba negando suas qualidades o que a faz agir menos e ter resultados negativos, o que confirma suas ideias e mantém o estado depressivo. A falta de energia da depressão tem a ver com estes elementos e não com a tristeza. Uma emoção mais adequada para descrever o transtorno é a apatia, crença de que não adianta fazer nada, porque nada vai dar certo.
Assim sendo, o apoio na depressão precisa saber ver isso na pessoa que sofre. Não se trata de uma tristeza ocasionada pela perda de um emprego. Se trata do sentimento de certeza que a pessoa tem de que ela: “não vale nada, por isso perdeu o único emprego que o aceitou, traste do jeito que é. E agora? Quem vai me aceitar assim? Não sei o que fazer com a minha vida, melhor se nem estivesse aqui”. Esta é uma frase ligada com uma depressão profunda, por exemplo, algo bem longe do sentimento de tristeza: “eu gostava muito dele, vou sentir muitas saudades, isso dói, mas com o tempo passa”.
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