• 26 de julho de 2013

    Identidade e processo

    – Tenho pensado sobre mim

    – Hum, isso é bom, no que você tem pensado?

    – Eu acho que tenho pensado e agido, na verdade sabe?

    – Sei, mas fale um pouco mais sobre isso.

    – É que você me conhece e sabe que eu sou uma pessoa que tende à não falar o que quer, não brigar pelo que quer e tenho pensado no que aconteceria se eu fizesse o contrário

    – E?

    – E daí que tenho feito… vem aquela pergunta: porque não dizer ou fazer isso agora?

    – E como tem sido a experiência?

    – Um tanto revigorante, um tanto frustrante e um tanto angustiante

    – Uau, altamente intenso não é mesmo?

    – Pois é… revigorante quando eu faço e aquilo me nutre; frustrante quando não faço ou quando faço e não gostei do que fiz, quando a coisa parece que não bate entende como?

    – Entendo

    – E é daí que vem a angustia, porque fica aquele vazio do tipo: “tá não era isso, então o que é?”

    – E como você tem respondido?

    – Às vezes não respondo, às vezes vem a ideia de fazer outra coisa e algumas vezes venho a entender que não tem nada para fazer, mesmo!

    – Que experiência rica hein? Me parece que você está buscando um profundo contato contigo mesmo, com o que você é e com o que está nascendo ai dentro.

    – Pois é, é como eu me sinto… é ao mesmo tempo forte e frágil entende?

    – Sim.

    Somos aquilo que consumimos, gostamos, usamos e praticamos ou somos o processo que cria isso?

    A pergunta não vai ser respondida neste post, na verdade, quero deixar você leitor justamente com a dúvida, mas isso não me impede de fazer algumas reflexões…

    É impossível para o ser humano viver sem estar identificado à uma imagem de si, do mundo, de como as coisas são. Esta identificação é o que nos dá senso de “eu” e nos individualiza. Porém este “eu”, longe de ser estático tem se mostrado cada vez mais  – através das pesquisas – um processo com pontos mais rígidos e alguns pontos altamente flexíveis. Assim, cabe a pergunta sobre quem realmente somos a identidade ou o processo.

    Talvez a pergunta capciosa possa ser respondida com uma outra pergunta: seria a identificação e o processo duas entidades distintas?

    Podemos pensar que somos aquilo que fazemos, que pensamos, que consumimos ou podemos pensar que somos o processo que cria em nós o pensamento e as ações. Também é plausível refletir que ambos são uma só coisa aparecendo de maneiras diferentes para nós ao longo do tempo. Algumas pessoas mais velhas, ao olharem em retrospectiva para suas vidas percebem que tudo o que ocorreu deveria ter ocorrido exatamente daquela forma, como se uma “orquestra invisível” estivesse tocando uma sinfonia já escrita, como se um processo grandioso estivesse presente o tempo todo, porém só perceptível em retrospecto. Esta é a hipótese que nos fala sobre a possibilidade de que aquilo com o que nos identificamos e aquilo que cria a nossa identidade sejam um só processo, com etapas diferentes. Como isso funcionaria?

    Especulo que podemos entender que aquilo com o que nos identificamos é a parte final do processo, a cristalização na qual vamos para a experiência concreta: nossos gostos, nossos pensamentos, nossas ações são elementos tão concretos e rígidos – no sentido de que uma vez pensado, pensado está; ou uma vez tomada uma ação, tomada está – que representam o final de um processo evolutivo. O ápice de toda uma estruturação interna que culminou no que nos identificamos hoje.

    O outro lado da moeda é algo que é mais imperceptível e tem a ver com as experiências que vamos tendo com o que nos identificamos hoje, com a repercussão que isso tem dentro de nós e com as ideias que surgem em nossa mente. Este processo está validando, questionando e pedindo por novas identificações o tempo todo. Isto é o que nos move em direção às mudanças que fazemos em nossas vidas – e estamos fazendo isso o tempo todo. Assim esta é a parte fluída, a parte onde o “eu” é algo ainda indiscriminado, algo “maior”, em ebulição buscando uma forma de ser expresso e, quando encontra, torna-se identidade.

    O grande ponto, no entanto, é o seguinte: consigo perceber minhas identificações e meu processo e me entregar à ele? Ou boicoto aquilo que sou e aquilo que busca expressar-se em mim – note que quando coloco “aquilo em mim” quero dizer que é “algo” que não sou “eu” no sentido de que ainda não me identifiquei com aquilo, sendo assim embora esteja dentro de mim ainda não sou eu. Creio que o processo terapêutico é fundamental para ajudar a pessoa à exercitar este processo de ser e tornar-se – ou vir-a-ser como preferem os existencialistas.

    Pergunte-se: quantas vezes você já boicotou algo que estava nascendo em você? E se você deixasse aquilo vir? Quantas vezes você menospreza aquilo que você é hoje? E se você valorizasse? Obviamente a experiência do “eu” é algo sem fim, porém isso não implica dizer que não possui finalidade. Aproveite!

    Abraço

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