• 6 de agosto de 2016

    Integridade e recompensa

    – Bom, daí ele me disse que ele estava arrependido e eu me senti bem melhor.

    – Que pena.

    – Pena? Porque? Ele me falou que se arrependeu.

    – Sim, mas o que ele fez não te incomodou de verdade, foi apenas um jogo que você jogou.

    – E qual o problema Akim?

    – Que é uma mentira que, agora, você vai ter que manter.

    – Hum…

    – Porque se não manter, ela vai aparecer e quando aparecer você será obrigada a se confrontar com a pergunta: digo a verdade para ele ou não?

    – Ai… é verdade…

    – Então virá outra escolha: serei íntegra comigo ou com a mentira que contei?

     

    Porque se entregar à uma tarefa? A motivação para fazer algo, quando confundida com o resultado pode ser contraprodutiva e ao invés de ajudar, atrapalhar.

    Para entender isso, é importante compreender que nem tudo o que se faz tem como meta a aquisição de um resultado benéfico para si. Se você ficou confuso com esta afirmação, pode ser porque a sua noção de integridade pessoal não está bem formada.

    Tomemos um exemplo simples, para ilustrar a afirmação acima: o recebimento de troco maior que o devido. Ao receber “mais” dinheiro que o necessário a pessoa deverá tomar (caso, obviamente, perceba o ocorrido) a decisão de devolver o excedente ou mantê-lo para si. Nesse sentido, caso ela opte por devolver o troco e se comprometer com uma noção de justiça, por exemplo, ela estará tendo uma “perda”.

    No exemplo acima pode-se questionar a “perda” que a pessoa teria, afinal, ela não teria, de fato, um ganho próprio, seu ganho estaria ocorrendo pelo erro de outra pessoa. Seria diferente se o excedente se devesse ao seu trabalho próprio. Por outro lado, alguém pode objetar: ela não tem culpa do erro do outro, então é, sim, um dinheiro “fácil” que ela recebeu e a decisão de devolvê-lo ou não recai sobre os valores morais que ela segue.

    A mesma questão recai, por exemplo, nas relações interpessoais. Muitas vezes quando uma pessoa está insegura em uma relação (ou é insegura) cria situações nas quais o outro se sente culpado por alguma coisa que fez ou deixou de fazer. O fato é o inseguro sabe que o fato não lhe incomoda de verdade, mas mesmo assim sente-se bem em ver a culpa no outro. A culpa, neste caso, significa uma espécie de “segurança” como se o parceiro dissesse: “eu me importo com você” e isso tranquiliza o inseguro.

    Porém, a culpa, neste caso, é indevida porque o inseguro não se sente ameaçado de verdade, isso significa que o outro está se sentindo culpado em detrimento de um erro de percepção da parte dele (pessoas maduras, dificilmente caem neste tipo de armadilha emocional). Assim, não seria “honesto” por parte do inseguro, voltar atrás, pedir desculpas e deixar o seu “ganho” de lado afim de uma vida mais íntegra?

    Honesto? Sim. Tentador? Não. Ocorre que as pessoas, de fato, preferem este ganho ilusório do que a verdade onde perdem algo em detrimento de um aumento de auto estima. Este é outro tipo de caso em que agir em prol da honestidade nos traz um “prejuízo”.

    A integridade nem sem traz ganhos sejam materiais ou emocionais aquele que busca por ela, porém a noção de que ser íntegro nos traz ganhos é, por si só, equivocada. Não se é íntegro “para algo”, no sentido de algo externo, a integridade é um movimento para dentro, ou seja, somos íntegros “porque”, a integridade é causa de ação e não meio para satisfazer uma necessidade.

    Assim sendo, se você busca ser “íntegro”, “honesto” para alcançar algo com isso, equivoca-se em princípio, pois essas características são forças motrizes da ação e não ferramentas para fins. A objeção é de que sendo honesto você terá relações mais verdadeiras, por exemplo. Esta objeção também é falaciosa porque a relação depende do outro e se este não for honesto com você a “relação” em si, não será “verdadeira”. O consolo de que “pelo menos eu fui verdadeiro” também é uma falácia porque busca eximir a pessoa de certa culpa, mas o fato é mais cru do que gostamos de admitir: se eu, sendo honesto ou não, me envolvi em uma relação “falsa”, isso diz menos da minha integridade e mais da minha competência em avaliar com quem me envolvo.

    Então, para finalizar, a integridade não é um meio para alcançar um fim, mas sim a motivação pela qual organizo meus atos. O fato é que muitas vezes ser íntegro pode me fazer ter perdas materiais e emocionais, porém, para quem, de fato, é íntegro isso só se torna um problema quando a perda pode ir contra a vida da pessoa.

    Abraço

     

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