• 3 de setembro de 2014

    Mudar de ideia

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    • Então… eu fiz algo novo esta semana.

    • O que foi?

    • Eu mudei de ideia!

    • Ah é? Olhe só, me conte como foi.

    • Eu tinha decidido que iria viajar e decidi, meio que na última hora ficar em casa.

    • Porque?

    • Bem… eu estava um tanto desconfortável com a ideia de ir viajar, tinha algo que não estava se encaixando sabe?

    • Como o que?

    • Bem… eu não sabia ao certo se era uma boa ideia entende? Tinha algo que não estava se encaixando bem.

    • Entendi. E daí você resolveu ficar.

    • Não foi só isso… eu realmente tinha coisas que queria fazer em casa entende? Não foi só “não quero ir para lá”, foi também um “quero ficar aqui”.

    • Ahh… muito bom!

    • Sim e também uma coisa de “aqui vai ser melhor do que lá”. Me imaginando lá fazendo o que eu precisava fazer e aqui eu preferi ficar aqui.

    • Perfeito, parabéns!!!

     

    Mudar de ideia. Para muitas pessoas isso é praticamente um sinônimo de fraqueza ou de falta de caráter. A ideia de assumir uma ideia, um posicionamento o um compromisso e depois trocar, mudar, fazer diferente daquilo que havia sido combinado é um crime.

    Obviamente existem pessoas que trocam tanto de ideia e com tanta frequência que isso se constitui num problema de fato porque demonstra uma dificuldade de se comprometer ou de assumir que não quer alguma coisa. No entanto para outras pessoas é um avanço quando elas conseguem dizer “ok, desta vez não irei”.

    Mudar de ideia é algo que tem a ver com a flexibilidade da pessoa em lidar com incongruências. Quanto mais a pessoa tolera a incongruência, mais ela consegue mudar de ideia (por isso que, em excesso, ela pode ser um problema). O tema é culturalmente conturbado porque vivemos numa sociedade que preza a congruência e a padronização. Assim sendo estas duas qualidades são elevadas enquanto que a ideia de incongruência é tida como inadequada.

    No entanto, como nos lembra Nietzsche as virtudes podem nascer de todos os lugares e não apenas daquilo que é enaltecido pela cultura. Assim sendo a incongruência pode ser virtuosa também, mas como? O que é ser incongruente? Incongruência é quando algo “não combina” com o restante de um conjunto, ou seja, a pessoa está trajada com uma toga grega e nos pés veste botas de soldado moderno, é algo que “não combina”, que não possui congruência com o restante.

    No meu consultório, por exemplo, as pessoas dizem que querem namorar, por exemplo, mas na prática mostram comportamentos de quem não quer um compromisso sério. Este é outro exemplo de incongruência. Ou então desejam isso, mas tem como crença de que todo homem/mulher é pilantra; ou seja, aquilo que pensam não está em congruência com aquilo que dizem querer. Assim sendo o querer, o pensar e o agir podem estar indo cada um para um lado, isto é incongruência.

    Onde está a virtude nisto?

    Em toda a incongruência existe algo inexplorado. Nada nasce congruente, tudo nasce incompleto, e, por esta razão não está “congruente”, não são todas as partes que estão em perfeita sincronia umas com as outras. A incongruência é onde existe o espaço da exploração daquilo que virá-a-ser. Pessoas com baixa tolerância à incongruência não são muito boas em refazer planos, em mudar de estratégia, ou seja, não são muito flexíveis. A flexibilidade precisa da incongruência. Quando tudo está indo no caminho predito não preciso ser flexível, preciso apenas seguir meu caminho. Mas quando se percebe que os planos não estão de acordo, que o que foi pensado está errado, aí a incongruência entra em cena e, com ela, a possibilidade de novas escolhas, novas visões, novas percepções.

    Quando me possibilito olhar para uma escolha já feita e perceber que ela pode estar parecendo incongruente eu estou me possibilitando rever aquilo que pensei, em pensar no que já pensei com novos olhos, num novo contexto, em tomar o que é certo e revê-lo e para isso preciso suportar a incongruência que vem acompanhada desta sensação. Assim poder mudar de ideia é tornar uma ideia já concebida incongruente com o momento presente por qualquer motivo (e aí entra a noção de quanto isso pode ser ou não saudável). No caso acima, por exemplo, havia uma concepção que trazia uma nova luz, um novo sentido aquilo que estava previamente planejado.

    Este é, inclusive, um diferencial para mim. Quando a pessoa “muda de ideia” é importante que pelo menos no médio prazo a nova medida lhe traga uma sensação moral de satisfação. Sei que o cliente está exagerando nas mudanças de escolhas quando ele muda de ideia e continua ansioso em relação ao que fez. Ocorre da pessoa ficar um pouco ansiosa e logo perceber que não precisa, ou então de ela não ter prazer com a escolha e perceber que, mesmo assim, foi a escolha certa.

    E você: suporta a incongruência?

    Abraço

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