• 4 de maio de 2016

    Desempenho

    – Eu não sei… mas sinto como se ela não me aceitasse entende?

    – Sim, entendo sim.

    – É como se perto dela eu ficasse meio… sei lá como.

    – “Meio”? Esta palavra tem duplo sentido, será que você fica “dividido” perto dela?

    – Não tinha pensado assim.

    – O que você mostra de você para ela, afim de que ela aceite ou não?

    – Não sei… tenho medo de me mostrar entende?

    – Talvez, então você mostre apenas o que ela quer ver?

    – Pode ser.

    – Nesse caso, ela está conhecendo você ou o seu desempenho?

    – Boa pergunta.

     

    Ser merecedor, ser o melhor, fazer por merecer. Os lemas da nossa sociedade podem ser muito úteis quando o assunto é algo prático, porém, na medida em que achamos que temos que merecer amor, o problema se torna grande.

    De que maneira você aprendeu a ser amado? De que maneira aprendeu que o amor precisava ser mantido? Estas duas perguntas, embora “simples”, organizam muito de nossa vida psíquica e nos trazem inúmeras consequências na vida adulta assim como na adolescência.

    O amor e a aceitação geram vínculos são a “cola” que mantém as pessoas grudadas. Estes vínculos são importantes ao ser humano que é um animal gregário por excelência. Quando aprende-se que o amor, sua manutenção e a aceitação em um grupo devem ocorrer pelo que somos, aprendemos de uma maneira mais tranquila a ser quem somos. Porém, infelizmente, poucos de nós aprendem dessa maneira.

    A maior parte de nós aprende que para sermos aceitos em grupos precisamos ter algo para mostrar. Este “algo” pode ser muitas coisas, desde boas notas, até um expert nos esportes. Porém, aqui começam os problemas, no momento em que o ingresso num grupo ocorre mediante a existência de uma determinada característica assim como sua manutenção a pessoa aprende que deve mostrar a característica antes dela mesma.

    Desta maneira é que se aprende que é mais importante o que representa do que quem você é. Este sistema se aperfeiçoa ao longo do tempo e a pessoa começa a entender que é melhor ela não mostrar quem ela de fato é, afinal de contas, se já passou tanto tempo “merecendo” o seu lugar, é melhor não ousar. Mostrar quem se é passa a ser algo passível de exclusão social.

    Ter o seu lugar no grupo, assim como viver, passa a ser algo para aquela parte nossa que mostra o desempenho, que “faz e acontece”. O “eu” tende a ficar esquecido e o desempenho é o que conta, as habilidades, a perfeição, o sorriso, o carisma, o carro, o peso ou qualquer outro atributo ao qual a pessoa se reduza.

    A sensação é de cisão, de que algo falta, mas não se sabe o que, de falsidade ou até de loucura. O amor, aceitação ganhos com o desempenho, em geral causam sofrimento psíquico. A manutenção da máscara é custosa e a pessoa sente este custo como se estivesse enjaulada dentro de uma prisão sem paredes. A causa do sofrimento psíquico é que a pessoa sabe que não é amada, mas sim o seu desempenho.

    Este, por outro lado, pode oferecer à pessoas muitas coisas boas como casa, comida, uma boa conta bancária. O fato é que as competências realmente trazem resultados, o problema é que o resultado mais importante: sentir-se amado não vem, independente de quanto a pessoa seja boa, porque ela nunca mostra, para ser apreciado, aquilo que ela realmente é.

    Abrir-se gera medo, culpa, vergonha, remorso e toda sorte de emoções negativas porque estamos enfrentando uma crença que nos disse para não nos mostrar. Porém, com o tempo, rapidamente o alívio, paz e tranquilidade em ser quem se é também vem. As pessoas aprendem que podem ser quem são e, ainda assim, viverem uma boa vida com pessoas que “as” amam de verdade.

    Abraço

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