• 25 de maio de 2015

    Programando tragédias

    arriscar+-+formiga+diabética+1

    – Mas é que o meu problema é outro.

    – Qual é? Não estou entendendo.

    – Você está falando de eu lidar com ele, mas eu quero é que eu nem precise fazer isso entendeu?

    – Como se ele já soubesse o que “deve” fazer?

    – Sim!

    – Você quer controlar ele então?

    – Precisamente!

    – Hum… e para que?

    – Para que ele faça o que eu quero.

    – O que acontece se isso não acontecer?

    – Prefiro nem pensar… mas não vai acontecer?

    – Como você sabe?

    – Ah… tem que dar certo sabe?

    – Sim, eu sei. Mas se não der…o que você imagina que te acontece?

    – (silêncio) Prefiro nem pensar… mesmo…

    – É difícil falar disso não?

    – É…

     

    Prestar atenção aos perigos do mundo e prever possíveis problemas é uma das habilidades que fez o ser humano evoluir ao seu status atual, porém esta mesma competência pode ser altamente prejudicial.

    Acredita-se que a habilidade de antecipar-se à possíveis problemas foi altamente desenvolvida durante a última era glacial. O ato de engordar é uma forma do organismo reagir à escassez de alimentos, por exemplo. Antecipar o momento do anoitecer, a vinda do inverno ou o ataque de predadores é uma forma de garantir a sobrevivência e ganhar certo controle sobre o ambiente. Este controle, no entanto tem o seu preço.

    O preço que muitas pessoas pagaram na era glacial e que continuam pagando hoje é o de estar com a mente ocupada em elaborar problemas. Ou seja, para me preparar para a chegada de predadores tenho que, antes, imaginá-los, temê-los e buscar, a partir disso, uma maneira de me livrar deles, de neutralizar a sua ação sobre mim. Preparar-se para evitar o tigre dentes-de-sabre ou o despejo são duas situações em que a mesma estratégia mental é empregada: a evitação.

    Como já afirmei acima o problema com a evitação é que ela precisa criar o cenário ruim o qual a pessoa desenvolve um método para evitar. Logo a pessoa deve estar o tempo todo pensando em possíveis cenários ruins para evitar afim de sentir o alívio que vem quando nada de ruim acontece. A motivação acaba sendo baseada em evitar o negativo, em perceber que nada de ruim aconteceu. O ônus é ter que estar o tempo todo imaginando o ruim.

    Porque ônus? Pois para proteger-se do ruim passamos a controlar. O controle é um método que é altamente exigente e desgastante. Quanto mais se controla, mais se deseja controlar. Portanto ele não tem fim e este é o seu problema: aprisiona a pessoa e a sua mente. O foco torna-se exclusivo: não ter nada de ruim ocorrendo. Mas porque fazemos isso?

    Ao mesmo tempo que o controle é nocivo ao aprisionar o indivíduo, ele lhe oferece uma certa noção de potência. Ou seja, se de um lado o ambiente é hostil e precisa ser controlado, por outro serei eu quem irá controlá-lo. Esta percepção que o controle gera pode ser viciante. Controlamos porque tememos o mundo, mas se a recompensa do controle é a sensação de potência, a pessoa pode sentir-se mais forte que o ambiente. Ou pelo menos é o que ela pensa. A sensação é uma farsa visto que a própria pessoa sabe que precisa sempre estar atenta para um novo perigo que pode surgir.

    No mundo glacial os perigos eram de certa forma reduzidos, controlar o frio, a fome e os predadores era garantia enorme de sobrevivência. Hoje, porém, muitos elementos podem ser sentidos como ameaças que precisam ser controladas. Inúmeras são as pessoas que sentem cada pequeno passo do dia a dia como um grande problema a ser solucionado. Assim a sensação de poder sobre o meio é ainda mais viciante, quanto mais o mundo externo pode parecer ameaçador, mais a pessoa deseja sentir-se poderosa. Quanto mais ela consegue controlar mais ela sente-se assim e mais ela se afasta da sensação de ser desprotegida.

    É óbvio que sentir-se seguro é importante, porém a sensação que o controle passa não é essa. É diferente saber lidar com o ambiente e desejar controlá-lo deixando-o da maneira que você quer que ele seja. Isso é o que gera a sensação de controle e de potência sobre o mundo. Esse é o poder que vicia e adoece a pessoa que só consegue viver dentro deste esquema de controle-poder.

    Abraço

    visite nosso site: www.akimpsicologo.com.br

     

     

    Comentários
    Compartilhe: